terça-feira, 21 de outubro de 2014

Juízes de nós mesmos

Mais um filme que a crítica especializada falou mal, e eu fui ver... e gostei. Trata-se de "O juiz", com Robert Downey Jr e Robert Duvall: uma história sobre a imaturidade, a teimosia e o amor brigão de filhos que insistem na necessidade adolescente de se diferenciarem dos pais, e só conseguem isso através da cisão.

É um drama edipiano sim, como são todos os enredos de pais e filhos, e é por isso que convence.
Com algumas pessoas, o clique acontece mais cedo (que sorte), com outras, como o personagem de Downey, infelizmente a descoberta de que somos o legado dos nossos pais chega já bem tardiamente, o que dá mais credibilidade à história.

Olhe ao seu redor e verá como existem por aí filhos famintos de tudo... tão ávidos pelo que clamam não terem tido nunca, e que, devido a esta avidez, tornam-se incapazes de usufruir do que os pais a vida inteira lhes deram...  
À certa altura do filme, há um diálogo em que o filho se queixa:

-- Você me colocou em um reformatório!
Ao que o pai responde:

-- VOCÊ se colocou lá.
Então o filho lamenta:

-- Eu me formei em Direito e fui o melhor aluno!
Ao que o pai comenta:

-- Não precisa me agradecer...
Frente a esta discussão, me flagrei dando risadas diante de tanta crueza e verdade nas palavras do pai, e tanta carência e infantilidade nas queixas do filho, que em outra cena comovem a plateia quando o primeiro, debilitado, necessita da ajuda do segundo, para um banho: a figura do respeitável juiz se despedaça diante dos nossos olhos, da maneira mais cruel que só a velhice e a doença são capazes de fazer, humanizando as mais frias relações como nada mais.

O ser humano tem a tendência de se desculpar e de jogar bem longe a responsabilidade pelos seus desacertos, e nessa hora a infância triste, os pais muito duros ou os terríveis traumas sofridos em algum momento da vida levam a culpa “numa nice”.  Se culpar os outros é fácil, culpar os pais é facílimo, inclusive porque eles são generosos o bastante para nos perdoar!

 O difícil é o bebê chorão crescer e assumir a responsabilidade por seus próprios atos, dar um jeito nas consequências de suas escolhas e atitudes... admitir que fez as escolhas erradas; que demorou pra “cair na real”; que não entendeu que o tempo passa... que teve medo de amadurecer, mas não soube pedir ajuda...  

E quando chega o dia da prestação de contas, quando o filho deixa de ser filho, quando a cadeira do pai fica vazia, haja maturidade conquistada para entender que somos sim a herança dos nossos pais a este mundo: a continuidade deles.
Juízes da nossa própria consciência, tomara Deus que em paz com ela!


2 comentários:

  1. Fernanda,

    Eu tambem vi o filme e gostei muito .... por ser um filme maduro e que retrata muitas das vezes a relacao de pais e filhos. como voce tao bem o descreveu. E realmente nos somos como os nossos pais (ahhhh lembrei da Elis Regina .....saudades .....) pois somos na realidade um pouco de tudo que vivenciamos desde a nossa infancia, e tiramos como exemplo, e familia e um deles.

    Felicidades,

    Gilda Bose

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  2. O seu comentário deve ser melhor do que o filme (ainda não o vi), pois não dissimula e nem escamoteia a questão básica existencialista que é sempre bom repetir: não interessa o que fizeram de você e sim, o que você faz ou pode fazer a partir daí, ou seja, tomar as rédeas da própria vida, levantando, sacudindo a poeria e dando a volta por cima, apesar dos pesares.Alguns felizardos não lamentam a queda do recipiente e a perda do contéudo...aprendem, com o tempo, a andar sobre o leite derramado e o que mais cair. A quantidade de criança quase idosa que existe (gente que passou dos 50 sem sair do 15, como bem disse Machado de Assis) é lamentável e assustadora. As pessoas - normalmente auto-indulgentes e super críticas quanto ao próximo-, quase sempre apodrecem antes de amadurecerem e passam a vida reclamando e culpando tudo e todos, quase sempre.

    O motivo principal do seu apreço pelo filme, se não estou equivocado "comme d'habitude" e como sói acontecer com pitaqueiros rs , é que tais temáticas são, em geral, bem recebidas pelo grande público. São obras que tratam de problemas muito comuns para essas pessoas; o distanciamento de um familiar – ou mesmo a perda de um- relacionamentos mal resolvidos do passado e a tentativa de reconciliação com a família. Somos colocados frente a situações semelhantes , na nossa vidinha louca e breve, com certa frequência, e ver uma história com a qual podemos nos identificar dessa forma, com ótimas atuações e uma parte técnica "roliudianamente" afiada, ainda que apoiada em um roteiro padrão, objetivando estatueta(s) "oscarinas", é sempre algo (re)confortante e bem-vindo, né?
    .
    Santé e axé!
    Marcos Lúcio

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