Depois de um bom tempo, voltei às Minas Gerais.
Já passava da hora do almoço quando chegamos a Tiradentes, mas os restaurantes estavam todos lotados. Quando finalmente conseguimos uma mesa, o garçon, em vez de trocar a toalha, começou a pescar os restos de comida deixados pelo cliente anterior:
-- Não vai trocar a toalha?
-- Não.
-- Não?!
-- Ocê acha que precisa messss? Nóis não dá conta de trocá todas toalha não!
Ao perceber que não tinha escapatória, ele, contrariado, satisfez meu desejo; então comemos ali mesmo, no único restaurante mineiro que já vi, em toda a minha vida, que conseguiu a proeza de servir uma comida ruim. O torresmo, por exemplo, era uma tira de borracha colada a uma sola de sapato. Onde já se viu torresmo ruim em Minas Gerais, meu Deus do céu?
Depois, fomos direto ao posto de atendimento ao turista:
-- Por favor, qual é a melhor pousada da cidade?
E o rapaz me diz:
-- Em cima do posto de gasolina tem um hotelzim que é bem limpim.
Mudei de assunto:
-- E um restaurante que seja ótimo?
Ele:
-- Ali na praça tem um de comida a quilo que é bem baratim.
Vê-se logo como estão preparados os guias da cidade...
Fiquei surpresa ao descobrir que o velho pão de queijo está perdendo espaço para o rocambole. Numa das muitas docerias que agora tentam trazer de volta a tradição mineira do pão-de-ló recheado com doce de leite, e que anunciam "o melhor rocambole do mundo", "o rei dos rocamboles", "o tal", "o gostosão", " o mais fofo de todos", "o mais recheado" e eticétera... decidi alegrar meu paladar com este quitute que adooooooro, e que sei fazer muitíssimo bem, aliás. Fui logo avisando ao co-piloto:
-- Vamos ver se este rocambole é igual ao meu.
Logo na primeira mordida, meu parceiro de comilança pergunta:
-- E aí?
Perdoem-me os leitores, mas terei que ser sincera. Minha resposta foi curta e grossa:
-- Rocambosta.
Com a pança cheia e a pousada arranjada, fomos passear pela terra do herói da Inconfidência. Pena que a prefeitura teve a péssima ideia de plantar, bem no meio da praça, umas caixas de som que tocam altíssimo os mais diversos gêneros musicais, do "Ilariê" à música sertaneja modernosa e de péssima qualidade, passando por Titãs... nada a ver com o espírito local. Lembrei logo das sábias palavras saídas do tempo em que as novelas eram um bom programa: "a inguinorança é que atravanca o pogresso", dizia um personagem da finada "O bem amado". A turma com mais de 40 sabe do que estou falando.
Foi impossível não pensar em minha cidadezinha natal, cravada no sul de Minas e que perdeu toda a sua beleza original justamente devido a esta ideia distorcida de modernidade. Lá, as árvores centenárias foram cortadas, as ruas de pedra foram engolidas pelo asfalto e o casario típico foi tombado... não pelo governo, e sim pelas construtoras que chegaram com casas modernas bem cafonas e janelas de alumínio. Não sobrou nem a casa onde viveu Bárbara Heliodora, aquela mesma, da Inconfidência Mineira. Nos coretos, onde antes havia casais de namorados, bandinhas de música ou crianças brincando, agora reinam televisões transmitindo o lixo da TV aberta... em plena praça pública! É de se lamentar, mas esta é a onda progressista que caiu sobre quase todas as cidades do interior mineiro. Que tristeza... não volto mais lá!
Mas vamos falar de Tirandentes, onde tudo é caríssimo e uma colcha de retalhos custa 1.100 reais!
-- Mas os retalhos são costurados um a um!
O argumento da vendedora não foi o bastante para me convencer, e saí da loja direto para uma boutique cujo nome, "Ave Maria", deve também referir-se ao preço dos vestidos: em plena liquidação, os preços variavam entre trezentos e pouco e setecentos e pouco. Ao que respondi, sem pensar:
-- Ave Maria, deixa eu dar o fora daqui!
Pode ser que eu seja processada pelo Movimento dos Mineiros Inveterados, mas como eu mesma saí daquelas bandas, sinto-me à vontade para dizer que a mineirada é um povo que se acha o "tal", exatamente como os italianos, inclusive. Os preços cobrados na cidade são um desrespeito ao turista. Exemplos:
-- A diária é 420 reais e não tem TV a cabo nem telefone no quarto, mas pousada mió que a minha ocê num acha aí não, fio.
Ou:
-- Ô, beeeeeem... esse rocambole aqui é o mais maravilhoso que tem! Nossa tradição é de mais de 80 anos, sô!
Ainda:
-- Esta fronha custa 180 reais cada uma, mas foi feita por uma legítima bordadeira de Minas, uai!
O jeito é não entrar na onda e não comprar "nadica de nada", como diz o povo da terra. Em Tiradentes basta olhar ao redor, caminhar pelas ruazinhas e apreciar a igreja só pelo lado de fora, porque ali, assim como em Siena, resolveram cobrar ingresso na casa de Deus, e eu me recuso a pagar para entrar.
Mas a cidade é linda, o astral é altíssimo e se você procurar, pode encontrar bons restaurantes, pousadas que cabem no bolso, lojas onde é possível comprar móveis rústicos de qualidade (e a bons preços) e deliciosas compotas artesanais.
Mas o melhor de tudo é que a paisagem ainda é grátis.
segunda-feira, 30 de julho de 2012
quarta-feira, 25 de julho de 2012
O limite entre a cerimônia e a sabedoria
-- Não quer um pedaço de bolo, minha filha?
-- Nããããão, obrigaaaaaaaaada...
Ao bom entendedor, meia palavra basta. E pela entonação da recusa, a dona Fulana, amiga da minha mãe, viu que eu, com meu apetite de infância, queria o pedaço de bolo, era lógico, e de preferência bem grande. Para minha total falta de sorte, ela entendeu a mensagem e me serviu um pedação, que tive que dar um jeito de jogar pela janela, lá no meio do mato da horta vizinha, já que a cozinheira era péssima e o bolo estava tão ruim quanto bonito, em cima da mesa.
Tudo isso para dizer que sempre fiz tudo direitinho, conforme minha mãe me ensinou... e quando alguém me oferece alguma coisa, eu tenho que recusar três vezes, que é o que manda a cerimônia. Se tiver a sorte de uma quarta oferta, aí sim posso aceitar.
Bem... confesso que nem sempre fiz tudo direitinho... e ontem mesmo, no restaurante, foi uma das vezes em que minha mãe teria secretamente pisado no meu pé, debaixo da mesa.
-- Com licença...
O casal da mesa ao lado me olhou surpreso, enquanto eu me dirigia à moça.
-- Mas eu preciso saber onde você comprou esta medalha de Nossa Senhora das Graças...
Trocamos meia-dúzia de informações sobre medalhas, lojas e milagres, e eis que ela, de repente, abriu o fecho da corrente e me ofereceu a medalha, com um sorriso benevolente que só não me fez engasgar com o lanche porque eu ainda não havia começado a comer.
Num átimo, minha cabeça virou um liquidificador e misturou tudo: a cerimônia que eu tinha que fazer, o olhar de repreensão do meu marido (que me conhece tão bem...), o susto diante do gesto da moça, a medalha...
Tentei, juro que tentei:
-- Nããããão... eu não posso aceitaaaaaar...
Mas ela era tão boa entendedora das palavras quanto a dona Fulana, lá do começo da história, e insistiu sorrindo.
-- Pode ficar. É de coração.
Eu estava à beira de morrer de vergonha, mas... aceitei. E lá do céu, acho que minha mãe, vendo a situação, pensou no quanto sempre fui um pouco rebelde, como ela costumava dizer. E acho também que Nossa Senhora saiu logo em minha defesa e limpou a minha barra... porque Ela entende, eu sei, que obediência tem limite, e que também é divino aceitar os presentes que a vida nos traz, principalmente quando eles vêm embrulhados num gesto de autêntica doação.
-- Nããããão, obrigaaaaaaaaada...
Ao bom entendedor, meia palavra basta. E pela entonação da recusa, a dona Fulana, amiga da minha mãe, viu que eu, com meu apetite de infância, queria o pedaço de bolo, era lógico, e de preferência bem grande. Para minha total falta de sorte, ela entendeu a mensagem e me serviu um pedação, que tive que dar um jeito de jogar pela janela, lá no meio do mato da horta vizinha, já que a cozinheira era péssima e o bolo estava tão ruim quanto bonito, em cima da mesa.
Tudo isso para dizer que sempre fiz tudo direitinho, conforme minha mãe me ensinou... e quando alguém me oferece alguma coisa, eu tenho que recusar três vezes, que é o que manda a cerimônia. Se tiver a sorte de uma quarta oferta, aí sim posso aceitar.
Bem... confesso que nem sempre fiz tudo direitinho... e ontem mesmo, no restaurante, foi uma das vezes em que minha mãe teria secretamente pisado no meu pé, debaixo da mesa.
-- Com licença...
O casal da mesa ao lado me olhou surpreso, enquanto eu me dirigia à moça.
-- Mas eu preciso saber onde você comprou esta medalha de Nossa Senhora das Graças...
Trocamos meia-dúzia de informações sobre medalhas, lojas e milagres, e eis que ela, de repente, abriu o fecho da corrente e me ofereceu a medalha, com um sorriso benevolente que só não me fez engasgar com o lanche porque eu ainda não havia começado a comer.
Num átimo, minha cabeça virou um liquidificador e misturou tudo: a cerimônia que eu tinha que fazer, o olhar de repreensão do meu marido (que me conhece tão bem...), o susto diante do gesto da moça, a medalha...
Tentei, juro que tentei:
-- Nããããão... eu não posso aceitaaaaaar...
Mas ela era tão boa entendedora das palavras quanto a dona Fulana, lá do começo da história, e insistiu sorrindo.
-- Pode ficar. É de coração.
Eu estava à beira de morrer de vergonha, mas... aceitei. E lá do céu, acho que minha mãe, vendo a situação, pensou no quanto sempre fui um pouco rebelde, como ela costumava dizer. E acho também que Nossa Senhora saiu logo em minha defesa e limpou a minha barra... porque Ela entende, eu sei, que obediência tem limite, e que também é divino aceitar os presentes que a vida nos traz, principalmente quando eles vêm embrulhados num gesto de autêntica doação.
segunda-feira, 23 de julho de 2012
A barbárie devorou o amor de mãe
Sou de um tempo em que pai e mãe tinham parte com o Sagrado, então me pergunto que planeta é este em que vim parar, quando leio no jornal que menino de dois anos deu entrada no hospital com a perna quebrada, e o outro, um pouquinho maior, chegou quase morto à emergência... e não aguentou as pancadas.
Alguma coisa muito perversa está acontecendo no inconsciente coletivo. Sabe qual o problema? Falta de educação, de princípios, de moral, de discernimento. Estamos voltando à barbárie. A televisão, cada vez mais permissiva, faz piada de mau-caratismo... os sucessos que tocam no rádio só falam de sacanagem. E o ideal da juventude já não é mais conquistar uma profissão, ter uma família feliz e ser uma pessoa de bem e admirável: os anseios são todos da ordem do "ter", e o que se quer agora é um carrão, um apartamentão, um relojão, um casamentão! Educação e princípios? Quem é que liga pra isso?
A gente sabe que a vida vale pouco hoje em dia: quanta gente é assassinada e a família, se quiser, que reclame com o bispo?
Mas o que me impressiona é que até o "amor de mãe" entrou na dança... cadê o amor de mãe? Já não existe mais?
Numa inversão absurda de valores, muitas mulheres descem ao inferno para proteger o selvagem que quebrou a perna do bebê, mentindo diante do médico, do delegado e até do juiz, se for preciso: o menino está inchado deste jeito porque foi mordido por uma abelha, doutor!
Não é novidade pra ninguém que homem que não é bom filho ou bom pai também jamais será bom marido, mas há quem tope tudo para segurar um par de calças em casa, até mesmo permitir que o filho seja agredido, ou abrir mão dele, inclusive, porque o manda-chuva é muito macho mas não aceita filho de outro embaixo do "seu" teto. Conheço várias histórias de crianças criadas por avós justamente porque as mães tinham outra família pra cuidar.
Se a gente pensar que os leões, por exemplo, matam os filhotes alheios para garantir seu posto na liderança do bando, e às vezes chegam a devorar os próprios, podemos concluir que os animais irracionais são todos iguais, e precisam mesmo é de jaula aqui na civilização.
Mas e as mães? Busque na natureza uma fêmea qualquer que não proteja sua prole com garras e dentes, e não encontrará: todas estão prontas para morrer por seus filhotes, e ai do macho que tentar encostar a pata na molecada... até as amigas da vizinhança aparecem para cair de pau em cima do agressor.
Só mesmo entre a única espécie pensante que existe é que os pequenos viram saco de pancada nas mãos de gente que não abre as cortinas para bater em paz e aumenta o som do rádio quando o menino chora. A vizinhança toda sabe que o garoto está sempre roxo, que ele nunca sai para brincar... mas todo mundo diz, na delegacia, que não pensava que a coisa fosse tão feia assim.
E é deste jeito que ele acaba morto na cama de hospital, enquanto a barbárie continua no dia a dia de tantos outros, para quem a salvação também não há de chegar.
Alguma coisa muito perversa está acontecendo no inconsciente coletivo. Sabe qual o problema? Falta de educação, de princípios, de moral, de discernimento. Estamos voltando à barbárie. A televisão, cada vez mais permissiva, faz piada de mau-caratismo... os sucessos que tocam no rádio só falam de sacanagem. E o ideal da juventude já não é mais conquistar uma profissão, ter uma família feliz e ser uma pessoa de bem e admirável: os anseios são todos da ordem do "ter", e o que se quer agora é um carrão, um apartamentão, um relojão, um casamentão! Educação e princípios? Quem é que liga pra isso?
A gente sabe que a vida vale pouco hoje em dia: quanta gente é assassinada e a família, se quiser, que reclame com o bispo?
Mas o que me impressiona é que até o "amor de mãe" entrou na dança... cadê o amor de mãe? Já não existe mais?
Numa inversão absurda de valores, muitas mulheres descem ao inferno para proteger o selvagem que quebrou a perna do bebê, mentindo diante do médico, do delegado e até do juiz, se for preciso: o menino está inchado deste jeito porque foi mordido por uma abelha, doutor!
Não é novidade pra ninguém que homem que não é bom filho ou bom pai também jamais será bom marido, mas há quem tope tudo para segurar um par de calças em casa, até mesmo permitir que o filho seja agredido, ou abrir mão dele, inclusive, porque o manda-chuva é muito macho mas não aceita filho de outro embaixo do "seu" teto. Conheço várias histórias de crianças criadas por avós justamente porque as mães tinham outra família pra cuidar.
Se a gente pensar que os leões, por exemplo, matam os filhotes alheios para garantir seu posto na liderança do bando, e às vezes chegam a devorar os próprios, podemos concluir que os animais irracionais são todos iguais, e precisam mesmo é de jaula aqui na civilização.
Mas e as mães? Busque na natureza uma fêmea qualquer que não proteja sua prole com garras e dentes, e não encontrará: todas estão prontas para morrer por seus filhotes, e ai do macho que tentar encostar a pata na molecada... até as amigas da vizinhança aparecem para cair de pau em cima do agressor.
Só mesmo entre a única espécie pensante que existe é que os pequenos viram saco de pancada nas mãos de gente que não abre as cortinas para bater em paz e aumenta o som do rádio quando o menino chora. A vizinhança toda sabe que o garoto está sempre roxo, que ele nunca sai para brincar... mas todo mundo diz, na delegacia, que não pensava que a coisa fosse tão feia assim.
E é deste jeito que ele acaba morto na cama de hospital, enquanto a barbárie continua no dia a dia de tantos outros, para quem a salvação também não há de chegar.
sexta-feira, 20 de julho de 2012
Uma peixa fora d´água nos mares de Madureira
Meu amigo me convenceu: quando dei por mim estava em Madureira!
No trem da Central, vendedores ambulantes são um show de criatividade e locução. Olha alguns gritos de guerra:
- Super Bonde! Cola TU-DÔÔ!!!
-- Galak 1 Real, ooooi!
-- Vai chocolate? Sufré de dois! Ó o Sufré!!!!!
-- Coca, água, cerveja, águaaaaaaaaaaaa!!!!!!!!!!!!!!
O povo todo compra. Aliás, é impressionante como se come porcaria no trem, e as lixeiras não dão conta de tanta embalagem. A gente olha em volta e vê as mocinhas que voltam do trabalho com o sapato de salto guardado na bolsa e os pés ainda de meia-fina, descansando nos chinelos de dedo.
Chegando à Meca do consumo da zona norte, a gente não sabe pra onde olha, tamanha a oferta de tudo o que o cliente desejar; tem panela, copo, tapete e o trio cama, mesa & banho... tem as roupinhas coladas e chamativas que as cariocas tanto gostam... tem bijus para todos os gostos... e até uma loja de Relógio Cuco... mas os passarinhos não são alemães, são cariocas, nascidos e criados em Madureira, hein? Ou será que vieram da China?
-- Pode máquina fotográfica aqui não, ô madame!
E as “popozudas” reinam nas vitrines...
E os vestidos de festa?
No Mercadão, tudo limpinho e organizado. Muita loja de artigos pra macumba, ô!ô!, óia o véio Zuza aê... cada roupa linda.
E tem loja de brinquedos, de festas, de comida e temperos... a gente encontra tudo lá! A noiva de Madureira é fashion:
Depois de tantas emoções, sugiro traçar uma carne assada no restaurante próximo à passarela, e cujo marketing é feito pelo ex-radialista Sandro Madureira, responsável pela publicidade de 28 estabelecimentos das redondezas. Clique aí... e veja como só mesmo no Rio de Janeiro é que a gente vê uma coisa dessas:
No trem da Central, vendedores ambulantes são um show de criatividade e locução. Olha alguns gritos de guerra:
- Super Bonde! Cola TU-DÔÔ!!!
-- Galak 1 Real, ooooi!
-- Vai chocolate? Sufré de dois! Ó o Sufré!!!!!
-- Coca, água, cerveja, águaaaaaaaaaaaa!!!!!!!!!!!!!!
O povo todo compra. Aliás, é impressionante como se come porcaria no trem, e as lixeiras não dão conta de tanta embalagem. A gente olha em volta e vê as mocinhas que voltam do trabalho com o sapato de salto guardado na bolsa e os pés ainda de meia-fina, descansando nos chinelos de dedo.
Vai um tênis aí?
E um galo? Um coelho ou um pato? Alguém me disse que até um bode a gente encontra pra levar pra casa... quase comprei um pra fazer linguiça e dar de presente para o Migliaccio, do Rio Acima, que recentemente experimentou a iguaria no Nordeste e jura que é uma delícia.
-- Pode máquina fotográfica aqui não, ô madame!
Apesar da repreensão dos seguranças, não resisti, como se vê. Olha, achei o pessoal meio bairrista lá em Madu: simpatia não é artigo comum por lá, o que tira muito do prazer que o turista poderia ter no passeio, e isso é uma pena. O clima geral é de desconfiança... pesa uma tensão no ar, sabe como? E você, que não é da área, vira alvo dos olhares que parecem perguntar o que é que você está fazendo ali.
Me fiz de sonsa e continuei o passeio, para descobrir, entre outras coisas, que em Madureira os manequins não são esquálidos, muito pelo contrário. A turma que passa fome pra caber no jeans 38 não tem vez por ali...
Me fiz de sonsa e continuei o passeio, para descobrir, entre outras coisas, que em Madureira os manequins não são esquálidos, muito pelo contrário. A turma que passa fome pra caber no jeans 38 não tem vez por ali...
E as “popozudas” reinam nas vitrines...
-- Posso tirar uma foto? Adorei a loja!!!!!!!
As vendedoras me olharam com cara de desprezo e perguntaram em côro:
-- Jura?!
Na hora do lanche, o povo manda um pastel, recém- fritinho. Eu não me arrisquei: meu estômago não é chegado a aventuras e Madureira não é o melhor lugar do mundo pra gente ter uma dor de barriga súbita. O cozinheiro riu do meu interesse:
-- A senhora vai querer um?!
De repente vejo um rebuliço: com a eleição municipal chegando, a dupla Clarissa Garotinho e Rodrigo Maia estava ali para um comício com o povão. Não voto neles, mas banquei a papagaia de pirata e tirei uma foto com a Clarissa, só pra botar no blog. Fiz a pose para o meu amigo e... cruzes! Os fotógrafos aproveitaram pra disparar seus flashes... Deus me livre sair de “eleitora” no jornal...
No Mercadão, tudo limpinho e organizado. Muita loja de artigos pra macumba, ô!ô!, óia o véio Zuza aê... cada roupa linda.
E tem loja de brinquedos, de festas, de comida e temperos... a gente encontra tudo lá! A noiva de Madureira é fashion:
Se o Gilson Martins der um rolé por aquelas bandas, quem sabe varia nas estampas do Pão de Açúcar em suas bolsas? Vê se esta aí da Pantera não é a cara dele? Custa 40 reais.
Na loja onde comprei um cofrinho para minhas moedas de 1 real, perguntei ao vendedor como é que vou abrir o que estava comprando, que é de plástico. Ao que ele respondeu, com um risinho malicioso:
-- Traz aqui que eu abro pra você...
-- Traz aqui que eu abro pra você...
Mas o presente que eu comprei, e comprei aos montes, para distribuir entre os amigos, foi este aqui, ó:
Depois de tantas emoções, sugiro traçar uma carne assada no restaurante próximo à passarela, e cujo marketing é feito pelo ex-radialista Sandro Madureira, responsável pela publicidade de 28 estabelecimentos das redondezas. Clique aí... e veja como só mesmo no Rio de Janeiro é que a gente vê uma coisa dessas:
quarta-feira, 18 de julho de 2012
Periguete: vergonha nacional
Vejo em todas as revistas: a atriz Isis Valverde caiu na graça popular com sua personagem Suelen, a periguete que é muito engraçadinha e carismática lá na televisão, mas que na vida real é desprezada por todos, atémesmo por seus advogados de defesa nos tribunais das varas de família, quando acontece o divórcio e chega a hora da divisão de bens e de pedir pensão. A novela tem este poder misterioso de transformar as coisas e inverter a opinião popular: o que é que acontece no imaginário do público que transforma uma oportunista em febre nacional?
Dizem que a vida imita a arte, e assim como a Isis, na novela, as periguetes da vida real não economizam charme quando apostam pesado para fisgar um trouxa: o problema é que os homens conseguem ficar totalmente cegos quando os hormônios pulam, e é aí que a Periguete se dá bem.
Dizem que a vida imita a arte, e assim como a Isis, na novela, as periguetes da vida real não economizam charme quando apostam pesado para fisgar um trouxa: o problema é que os homens conseguem ficar totalmente cegos quando os hormônios pulam, e é aí que a Periguete se dá bem.
Então vem a
conta: em um país cheio de distorções como o Brasil, não poderia mesmo
funcionar direito esta questão da pensão alimentícia; se por um lado existem pencas de mulheres honestas, e que fazem das
tripas coração para criar os filhos esquecidos por um ex-marido cafajeste,
muito bem assessorado por uma defesa bem paga e que lhe ensina a transferir
todos os seus bens a terceiros... a gente também sabe que existe vilania na outra extremidade da corda, que não raro arrebenta para o lado errado. E a ex-mulher
oportunista, munida de advogados e cheia de contas para pagar... e que se crê merecedora de reparação pelo
divórcio? A “tipa” é capaz de “lutar com todas as suas forças”, como uma delas, conhecida nacionalmente,
disse há pouco tempo à imprensa, para sangrar o bolso do ex. Infelizmente, muitos juízes ainda caem na lábia chorosa destas atrizes, que bem poderiam estar no elenco das novelas...
Meu palpite é o seguinte: isso aí não tem
nada a ver com "necessidade". A conta que só cresce, com juros impossíveis, é a do
orgulho ferido. Ela quer que ele pague por ter ido embora... e que pague em dinheiro vivo!
Meu amigo advogado, especialista em divórcios litigiosos e divisão de bens, conta às risadas:
-- A ex-mulher pedia o carro, a casa, um dinheirão de pensão, e o cliente me dizia "isso é baraaaaaato pra me livrar deste encosto... pode pagar!".
Sabe o pior? Muitas delas se dão bem exatamente assim.
Esta categoria
envergonha o gênero e cospe em todas as conquistas femininas de autonomia,
liberdade, dignidade e capacidade. “Não trabalhei porque ele não deixava” ou “Abandonei
minha profissão por causa dele” são os argumentos aos quais recorrem em sua
defesa... e se é que isso de fato aconteceu, foi o bastante para lhes amputar a
capacidade de recomeçar?
Os homens
estão ficando com medo de mulher, e não sem razão. Tenho amigos que se recusam
a namorar porque estão convencidos de que a mulherada só quer dinheiro... ou
seja, no fim das contas, por causa desta turma, todas as mulheres do mundo passaram a ser perigosas.
Trata-se de um fenômeno comportamental,
presente em várias classes sociais, inclusive: já vai longe o tempo em que só os
jogadores de futebol, os políticos e os ricaços de berço eram o alvo ideal... minha faxineira
me conta que lá na Comunidade onde vive, os rapazes que conseguem entrar para o
serviço público viram sucesso entre as garotas da noite para o dia: é só
assumir a função.
Isso me faz
lembrar de uma mulher que conheci certa vez, muito infeliz e que acabou
sozinha, apesar da beleza e dos dois casamentos que teve. Lembro de seu triste jargão:
-- O
primeiro casamento é por interesse, o segundo é que é por amor.
Ai, ai,
Periguetes... seja pela vida que jogam fora, na tentativa de se dar bem, ou no ridículo que passam diante da opinião pública, que as vê como sanguessugas, no fim das contas elas acabam aprendendo que dinheiro não traz
mesmo felicidade a ninguém.
Parece, mais não é: Jessica Rabbit adorava o maridinho... e não tinha nada de Periguete!
Parece, mais não é: Jessica Rabbit adorava o maridinho... e não tinha nada de Periguete!
segunda-feira, 16 de julho de 2012
Procura-se uma testa para colar um rótulo!
-- Nooooossa, eu te achava tão chata e metida, mas você é muito legal!!!!!!!!!!
Esta é uma das frases que mais ouvi na vida, e desde quando era "criança pequena lá em Barbacena", como dizia o velho comediante mineiro (e pai da Glória Pires).
Lá pelos dez ou onze anos, eu ficava feliz e aliviada diante destas palavras: uma pessoa a menos no universo da cidadezinha do interior já não me achava uma chata. Anos depois, confortável em ser quem eu era, comecei a rir desta situação... e a dar de ombros frente ao julgamento alheio, porque se tem uma coisa que ninguém consegue ser neste mundo, é uma unanimidade.
Julgar é um perigo. Um risco muito grande, já que na maior parte das vezes é também uma porta aberta ao equívoco... quase sempre que julgamos alguém apenas com base em nossos sentimentos, julgamos mal, já percebeu?
Não sei exatamente por quê, mas baseamos nossa vida no julgamento contínuo; julgar é um ato inconsciente e automático em nossa mente. Um vício que, como todos os vícios, faz com que a gente perca muita coisa boa, porque toda dependência é burra e limitante.
No dia a dia da vida é tão dificil assim entender que as coisas (ou as pessoas) nem sempre são o que parecem? E que aquela ofensa dolorosa pode estar no seu ouvido, e não nas palavras que lhe foram ditas? Ou que a antipatia de alguém pode estar nos seus olhos, e não na pessoa que você está mirando? E que aquela velha dificuldade pode estar na sua maneira de entender uma situação, e não na situação em si?
Hoje em dia chego a me divertir quando alguém que não me conhece quase nada bate o martelo do julgamento e pronuncia a sentença. Esta semana mesmo, de quinta a domingo, ouvi de quatro pessoas legais e de bom coração (mas que mal sabem o meu nome) que sou assim ou assado, que faço isso ou aquilo por esta ou aquela razão... ouvi tudo com muita atenção, e mais uma vez ficou claro pra mim o quanto julgamos o outro a partir dos nossos próprios preconceitos. E é aí que está a nascente do erro. Pra dar certo, o julgamento tem que partir de atitudes, fatos, verdades irrefutáveis. E não de impressões.
Não, não nascemos com talento para juízes. Intuição, percepção, inteligência, experiência de vida, sabedoria... tudo isso nos auxilia a viver. Mas é bem diferente de colar um rótulo na testa das pessoas, simplesmente porque nossos próprios preconceitos, preferências, gostos, ideias, medos, repulsas, frustrações, simpatias e antipatias fazem com que nos sintamos incomodados diante delas.
Um leitor anônimo me mandou este vídeo, e achei que tem tudo a ver com o assunto.
Esta é uma das frases que mais ouvi na vida, e desde quando era "criança pequena lá em Barbacena", como dizia o velho comediante mineiro (e pai da Glória Pires).
Lá pelos dez ou onze anos, eu ficava feliz e aliviada diante destas palavras: uma pessoa a menos no universo da cidadezinha do interior já não me achava uma chata. Anos depois, confortável em ser quem eu era, comecei a rir desta situação... e a dar de ombros frente ao julgamento alheio, porque se tem uma coisa que ninguém consegue ser neste mundo, é uma unanimidade.
Julgar é um perigo. Um risco muito grande, já que na maior parte das vezes é também uma porta aberta ao equívoco... quase sempre que julgamos alguém apenas com base em nossos sentimentos, julgamos mal, já percebeu?
Não sei exatamente por quê, mas baseamos nossa vida no julgamento contínuo; julgar é um ato inconsciente e automático em nossa mente. Um vício que, como todos os vícios, faz com que a gente perca muita coisa boa, porque toda dependência é burra e limitante.
No dia a dia da vida é tão dificil assim entender que as coisas (ou as pessoas) nem sempre são o que parecem? E que aquela ofensa dolorosa pode estar no seu ouvido, e não nas palavras que lhe foram ditas? Ou que a antipatia de alguém pode estar nos seus olhos, e não na pessoa que você está mirando? E que aquela velha dificuldade pode estar na sua maneira de entender uma situação, e não na situação em si?
Hoje em dia chego a me divertir quando alguém que não me conhece quase nada bate o martelo do julgamento e pronuncia a sentença. Esta semana mesmo, de quinta a domingo, ouvi de quatro pessoas legais e de bom coração (mas que mal sabem o meu nome) que sou assim ou assado, que faço isso ou aquilo por esta ou aquela razão... ouvi tudo com muita atenção, e mais uma vez ficou claro pra mim o quanto julgamos o outro a partir dos nossos próprios preconceitos. E é aí que está a nascente do erro. Pra dar certo, o julgamento tem que partir de atitudes, fatos, verdades irrefutáveis. E não de impressões.
Não, não nascemos com talento para juízes. Intuição, percepção, inteligência, experiência de vida, sabedoria... tudo isso nos auxilia a viver. Mas é bem diferente de colar um rótulo na testa das pessoas, simplesmente porque nossos próprios preconceitos, preferências, gostos, ideias, medos, repulsas, frustrações, simpatias e antipatias fazem com que nos sintamos incomodados diante delas.
Um leitor anônimo me mandou este vídeo, e achei que tem tudo a ver com o assunto.
quinta-feira, 12 de julho de 2012
O predador que bebe lágrimas de sangue
-- Você está triste hoje?
A costureira que mal conheço me olhou surpresa, e seus olhos se encheram de lágrimas imediatamente.
-- Não dormi bem esta noite por causa do meu filho de 17 anos...
Sorri para ela.
-- Filho nesta idade dá preocupação, né?
Ela quase tropeçou nas palavras, enquanto as lágrimas começaram a cair:
-- Perdi a menina. Era linda, mas morreu antes de nascer. Era pra ter nascido em dezembro... e eu sempre sonhei em ter uma menina... hoje tive que tomar remédio por causa disso.
O resto do papo não vem ao caso, o que interessa é que o filho de 17 anos, que não estuda, não trabalha e passa o dia todo matando e morrendo nos jogos de computador também agride a mãe verbal e fisicamente, deu vários pontapés em sua barriga e já aprendeu sobre como tocar o terror dentro de casa. A moça costura pra fora e chega a ter medo de voltar pra casa, preferindo dormir no trabalho quando a coisa fica muito feia. Aos 38 anos, toma remédio para o coração e não pode mais ter filhos. Soluça ao dizer que o rapaz a culpa pelo divórcio... e pela ausência de um pai que desapareceu no mundo. Mas ela logo justifica a tirania:
-- Ele precisa de psicólogo.
-- Não. Quem precisa de psicólogo é você.
Nos poucos minutos daquela conversa, eu olhava para ela e pensava no quanto podemos errar simplesmente porque amamos demais. Mas o amor não pode ser cego, e muito menos burro: desculpar o indesculpável só vai piorar a situação. Tive pena daquela mulher desesperada, que se diz incapaz de ser violenta e não suporta mais os maus-tratos do filho a quem ela vê como uma criança rebelde, ainda que ele seja macho o bastante para torturá-la como um adulto que já treina para, futuramente, bater em sua própria mulher. Terrível dizer, mas é ela, mãe devotada e sofredora, e que ama tão mal, mesmo amando demais, quem está ensinando o moço a respeito da doentia relação entre opressor e oprimido. Mas ela não percebe isso, é claro, porque só tem boas intenções.
Amor não pode ser incondicional; nem mesmo amor de mãe. Se não houver limites, a convivência vai à selvageria e tira de dentro de nós aquele predador cheio de dentes, pronto a enterrar as garras na carne de quem a tudo suporta. Este animal vive na jaula imaginária que a civilidade construiu em cada um de nós, mas varia de tamanho e brutalidade, sendo imenso e arisco em algumas pessoas, ou domesticado e sonolento em outras...
Aquele "amor que a tudo perdoa", que já esteve tão em moda no passado, está entre os maiores enganos da história do homem e deveria arder na fogueira da Modernidade. Quantas histórias de crimes passionais e de jovens bárbaros que cometem absurdos começaram justamente com este tipo de perdão?
Olhei aquela moça chorando de mágoa e de frustração, e pensei que amor que se faz de cego chora lágrimas de sangue no final.
A costureira que mal conheço me olhou surpresa, e seus olhos se encheram de lágrimas imediatamente.
-- Não dormi bem esta noite por causa do meu filho de 17 anos...
Sorri para ela.
-- Filho nesta idade dá preocupação, né?
Ela quase tropeçou nas palavras, enquanto as lágrimas começaram a cair:
-- Perdi a menina. Era linda, mas morreu antes de nascer. Era pra ter nascido em dezembro... e eu sempre sonhei em ter uma menina... hoje tive que tomar remédio por causa disso.
O resto do papo não vem ao caso, o que interessa é que o filho de 17 anos, que não estuda, não trabalha e passa o dia todo matando e morrendo nos jogos de computador também agride a mãe verbal e fisicamente, deu vários pontapés em sua barriga e já aprendeu sobre como tocar o terror dentro de casa. A moça costura pra fora e chega a ter medo de voltar pra casa, preferindo dormir no trabalho quando a coisa fica muito feia. Aos 38 anos, toma remédio para o coração e não pode mais ter filhos. Soluça ao dizer que o rapaz a culpa pelo divórcio... e pela ausência de um pai que desapareceu no mundo. Mas ela logo justifica a tirania:
-- Ele precisa de psicólogo.
-- Não. Quem precisa de psicólogo é você.
Nos poucos minutos daquela conversa, eu olhava para ela e pensava no quanto podemos errar simplesmente porque amamos demais. Mas o amor não pode ser cego, e muito menos burro: desculpar o indesculpável só vai piorar a situação. Tive pena daquela mulher desesperada, que se diz incapaz de ser violenta e não suporta mais os maus-tratos do filho a quem ela vê como uma criança rebelde, ainda que ele seja macho o bastante para torturá-la como um adulto que já treina para, futuramente, bater em sua própria mulher. Terrível dizer, mas é ela, mãe devotada e sofredora, e que ama tão mal, mesmo amando demais, quem está ensinando o moço a respeito da doentia relação entre opressor e oprimido. Mas ela não percebe isso, é claro, porque só tem boas intenções.
Amor não pode ser incondicional; nem mesmo amor de mãe. Se não houver limites, a convivência vai à selvageria e tira de dentro de nós aquele predador cheio de dentes, pronto a enterrar as garras na carne de quem a tudo suporta. Este animal vive na jaula imaginária que a civilidade construiu em cada um de nós, mas varia de tamanho e brutalidade, sendo imenso e arisco em algumas pessoas, ou domesticado e sonolento em outras...
Aquele "amor que a tudo perdoa", que já esteve tão em moda no passado, está entre os maiores enganos da história do homem e deveria arder na fogueira da Modernidade. Quantas histórias de crimes passionais e de jovens bárbaros que cometem absurdos começaram justamente com este tipo de perdão?
Olhei aquela moça chorando de mágoa e de frustração, e pensei que amor que se faz de cego chora lágrimas de sangue no final.
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Como disse o Belchior, "não cante vitória muito cedo, não..."
Aconteceu numa época em que operar o nariz era o sonho da mulherada: numa entrevista por telefone, o cirurgião mundialmente conhecido me convidou para uma consulta:
-- Você gostaria de mudar alguma coisa na sua aparência? Venha ao consultório que conversamos.
Ele não precisou chamar duas vezes, e pelo simples fato de que eu achei o máximo conversar pessoalmente com o monstro sagrado das plásticas.
Diante dele, expliquei que, como toda irmã mais nova de um cara mala e implicante, passei a maior parte da vida sendo sacaneada por causa do meu nariz: este irmão mais velho não perdoava, chegando a quase me matar de constrangimento no dia em que me apresentou a um amigo que já era meu paquera:
-- Fernanda, este é o Fulano. Fulano, esta é minha irmã: o Nariz!
Não que este traço marcante do meu rosto realmente me incomodasse... mas já que eu estava ali, ganhando aquela consulta de presente... quem sabe a gente não aproveitava e mexia na situação?
-- Mas minha filha!!!!!!! Seu nariz é lindo! Mexer em quê?! Mais vale um rosto meio esquisito e interessante do que perfeito e sem graça! Você quer tirar a personalidade do seu rosto e ficar bonitinha?
Foi assim que o dr. Ivo Pintaguy acabou com as possíveis dúvidas que eu pudesse ter a respeito do assunto. Desfiou um rol de mulheres narigudas e lindas, entre elas Maria Callas, minha diva, Sophia Loren, aquele modelo de mulher, e Lady Di, que dispensa comentários. Imediatamente apaixonada por meu nariz, foi a minha vez de desfiar as palavras... e agradecer pelo milagre da mudança do ponto de vista.
-- Mas o sr. é mesmo o gênio da plástica... em cinco minutos de conversa acabou com meu problema, e sem precisar operar! Estou amando meu narigão!
Ao que ele rebateu:
-- É... mas quem sabe esta orelhinha...
Ditas por ele, estas palavras fizeram baixar em mim o espírito de Dumbo, e foi assim que fui parar na sala de cirurgia.
Pois bem: anos depois, me vi diante de uma respeitável cirurgiã, a quem fui pedir opinião.
-- Aos 44 anos, gostaria de saber se já está na hora de fazer algum procedimento para tirar o ar de cansaço do meu rosto...
Ela se surpreendeu ao saber minha idade, e cobriu minha pele de elogios.
-- Você é muito jovem! De quem herdou esta pele? E este tônus? Seu rosto é harmônico e descansado... não está na hora de fazer nada!
Pensei em todos os cremes que usei nos últimos vinte anos, no sol que não tomo no rosto de jeito nenhum, nos chapéus que batem ponto em minha cabeça e até nas vezes em que fui sacaneada por amigas por usar um guarda-chuva preto pra me proteger dos raios UVA e UVB, em maravilhosos dias de sol! Tá vendo como valeu a pena? Acabei de ser liberada pela cirurgiã plástica... e aos 44 do primeiro tempo! Eu já me preparava para encerrar a consulta quando ela repensou:
-- Mas as pálpebras...
-- Você gostaria de mudar alguma coisa na sua aparência? Venha ao consultório que conversamos.
Ele não precisou chamar duas vezes, e pelo simples fato de que eu achei o máximo conversar pessoalmente com o monstro sagrado das plásticas.
Diante dele, expliquei que, como toda irmã mais nova de um cara mala e implicante, passei a maior parte da vida sendo sacaneada por causa do meu nariz: este irmão mais velho não perdoava, chegando a quase me matar de constrangimento no dia em que me apresentou a um amigo que já era meu paquera:
-- Fernanda, este é o Fulano. Fulano, esta é minha irmã: o Nariz!
Não que este traço marcante do meu rosto realmente me incomodasse... mas já que eu estava ali, ganhando aquela consulta de presente... quem sabe a gente não aproveitava e mexia na situação?
-- Mas minha filha!!!!!!! Seu nariz é lindo! Mexer em quê?! Mais vale um rosto meio esquisito e interessante do que perfeito e sem graça! Você quer tirar a personalidade do seu rosto e ficar bonitinha?
Foi assim que o dr. Ivo Pintaguy acabou com as possíveis dúvidas que eu pudesse ter a respeito do assunto. Desfiou um rol de mulheres narigudas e lindas, entre elas Maria Callas, minha diva, Sophia Loren, aquele modelo de mulher, e Lady Di, que dispensa comentários. Imediatamente apaixonada por meu nariz, foi a minha vez de desfiar as palavras... e agradecer pelo milagre da mudança do ponto de vista.
-- Mas o sr. é mesmo o gênio da plástica... em cinco minutos de conversa acabou com meu problema, e sem precisar operar! Estou amando meu narigão!
Ao que ele rebateu:
-- É... mas quem sabe esta orelhinha...
Ditas por ele, estas palavras fizeram baixar em mim o espírito de Dumbo, e foi assim que fui parar na sala de cirurgia.
Pois bem: anos depois, me vi diante de uma respeitável cirurgiã, a quem fui pedir opinião.
-- Aos 44 anos, gostaria de saber se já está na hora de fazer algum procedimento para tirar o ar de cansaço do meu rosto...
Ela se surpreendeu ao saber minha idade, e cobriu minha pele de elogios.
-- Você é muito jovem! De quem herdou esta pele? E este tônus? Seu rosto é harmônico e descansado... não está na hora de fazer nada!
Pensei em todos os cremes que usei nos últimos vinte anos, no sol que não tomo no rosto de jeito nenhum, nos chapéus que batem ponto em minha cabeça e até nas vezes em que fui sacaneada por amigas por usar um guarda-chuva preto pra me proteger dos raios UVA e UVB, em maravilhosos dias de sol! Tá vendo como valeu a pena? Acabei de ser liberada pela cirurgiã plástica... e aos 44 do primeiro tempo! Eu já me preparava para encerrar a consulta quando ela repensou:
-- Mas as pálpebras...
Olha ele aí, genteeeeeeeeeeee...
segunda-feira, 9 de julho de 2012
O mal pode ser a sinceridade que sai da boca do homem
-- Oi! Tá grávida?
Não fosse ele médico, eu teria dormido sem esta:
-- Meus pêsames.
Já fazia um tempinho que eu não encontrava este meu amigo,
que, como se vê, prima por algo que ainda não sei se é sinceridade ou falta de
noção. Meu garfo parou no ar, com o pedaço de joelho de porco preso nele. Olhei
a salada de batatas no prato e suspirei:
-- Eu?! Grávida?!Não fosse ele médico, eu teria dormido sem esta:
-- Ah, então tá tomando cortisona?
Quase tive um treco, e meu apetite foi pro brejo.
É engraçado como algumas pessoas simplesmente não pensam
antes de abrir a boca. Eu mesma já passei por uma situação parecida, quando
voltei à aulas depois de mais de dois meses de
férias e encontrei uma colega de sala:
-- Fulaaaaana! E este bebê que não nasce? Nunca vi um
barrigão igual a este, menina!
-- Já nasceu e está
com quase três meses.
Pior foi a minha irmã, que depois de meter o cacete num
chato com quem estudava, ouviu da colega que a escutava atentamente:
-- Ele é meu namorado.
Ela tremeu nas bases e tentou ganhar tempo pra pensar:
-- É mesmo?
E se defendeu como pôde, apelando para a sinceridade:-- Meus pêsames.
A sinceridade, aliás, foi a tática que usei quando uma conhecida pediu minha
crítica a respeito de seu trabalho na televisão.
-- Está legal, mas se eu fosse você demitiria a figurinista.
-- Por quê?
-- É que seu figurino está ruim, as roupas te envelhecem.
Você precisa de coisas mais modernas.
E ela, gelada:
-- As roupas saíram do meu armário.
Por estas e outras é que eu, que não estou grávida e nem
tomando cortisona, começo a achar que opinião deveria ser igual a artigo em
falta no mercado: o cliente pede e a gente diz que não tem. E, mesmo que tenha,
guarda pra consumo próprio. Por falar em consumo, já que me chamaram de
gorda... vou ali bater um bolo pro
jantar.
Gorda, eu?!
sábado, 7 de julho de 2012
sexta-feira, 6 de julho de 2012
O patrimônio que traz felicidade
Tia Nazareth gostava de escrever suas poesias em papel de pão. E foi ela quem me ensinou o seguinte:
"Tenhas sempre em teu coração um pedaço de céu, um pedaço de flor e um todo de amor.
Em teu pedaço de céu
tenhas sempre uma estrela,
e se uma nuvem cobri-la,
em pensamento procura vê-la.
De teu pedaço de flor,
deixa cair na terra sementes,
de onde brotarão outras flores
que darás a toda gente.
Tira do teu caminho todo o espinho,
para que não firas aos que ao teu lado estão.
E com um pedaço de céu,
um pedaço de flor
e um todo de amor
Terás o universo em teu coração".
(Nazareth Paiva)
"Tenhas sempre em teu coração um pedaço de céu, um pedaço de flor e um todo de amor.
Em teu pedaço de céu
tenhas sempre uma estrela,
e se uma nuvem cobri-la,
em pensamento procura vê-la.
De teu pedaço de flor,
deixa cair na terra sementes,
de onde brotarão outras flores
que darás a toda gente.
Tira do teu caminho todo o espinho,
para que não firas aos que ao teu lado estão.
E com um pedaço de céu,
um pedaço de flor
e um todo de amor
Terás o universo em teu coração".
(Nazareth Paiva)
quarta-feira, 4 de julho de 2012
Reprodução assistida, adoção e preconceito
Leio no jornal sobre o número incrível de crianças nascidas via reprodução assistida: cinco milhões! Quanto dinheiro gasto, quanta dor física e emocional vivida em função do desejo de ter um filho... mas não é só isso: de ter um filho que venha com o nariz da mãe ou com os olhos do pai; que consiga sorrir meio de lado, daquele jeito que só a família Xis sabe fazer... Ou que seja bom-caráter assim como todas as gerações da família Y...
“Adotar é
muito perigoso. A gente não sabe de onde a criança vem, como é que são os pais
dela”, me disse uma vez uma amiga, a quem perguntei:
-- E quem é que garante que o seu ou o meu filho vai ser
gente boa?
Alguém realmente acredita que pais honestos e generosos geram
somente bebês honestos e generosos? E ela insistiu:
-- Aaahh, mas os pais podem ser viciados em alguma droga, e aí a criança vem com problemas... ou pode herdar alguma doença...
E nós lá somos descendentes do povo de Cripton, por algum acaso? E temos uma super genética, livre de qualquer defeito?
Desconfio que a verdadeira resposta para estas questões seja a fantasia de que, se o defeito vier de um filho consanguíneo, fica mais fácil engolir a decepção. Todo mundo quer um filho perfeito (e de preferência louro e de olhos azuis, se for adotado). Se vier com defeito de fabricação, mas for do mesmo sangue, é aceitável e o amor perdoa. Mas já pensou se não for? Ô arrependimento!
Uma segunda amiga falou a repeito de uma terceira:
-- Fulana finalmente vai aprender a ser menos egoísta, agora
que está grávida.
E desde quando maternidade ensina alguém a ser melhor pessoa? Quantos egocêntricos por aí creem que seus
filhotes são mais valiosos que os alheios, e lhes dispensam tudo o que
de melhor está ao seu alcance, motivados, lá no fundo, pela enorme vaidade disfarçada de
amor!
São pais que, ao olhar os filhos, veem o reflexo de si mesmos, como um espelho, e
não medem forças no velho discurso de “dar o que não tiveram" na tentativa de compensar suas próprias frustrações.
Ter um filho
é muito mais que passar pela gestação, sofrer a dor do parto ou torcer na sala
de espera para que o nascimento seja um sucesso. Muito mais também que ver seu rosto no rosto do bebê... sim, isso pode ser muito legal, mas está
longe de ser o grande barato neste relacionamento. O desejo de encontrar seus genes ali naquela criança tem origem onde? Na mesma vaidade de sempre.
É triste, mas a grande maioria das pessoas torna-se pai ou mãe sem jamais ter se perguntado se tem realmente desejo, talento ou condições emocionais ou financeiras para isso: e embarca nesta aventura sem pensar. O resultado são pais despreparados, muitas vezes até sem amor para doar aos filhos, sem paciência, sem amizade, sem tempo, sem vontade... e filhos que sofrem pela inconsequência de quem os colocou no mundo.
Por outro lado, aqueles que realmente nasceram para amar uma criança, talvez pudessem ser pais ou mães daquelas que já estão no mundo, e num mundo de pobreza absoluta, de carências das mais básicas, de fome de tudo. Elas não terão o mesmo sorriso da família, os mesmos olhos do pai, o mesmo nariz da mãe. Mas bate dentro delas um coraçãozinho absolutamente cheio de amor para dar a quem precisa.
domingo, 1 de julho de 2012
Nossa sombra também atende por Inveja
Era uma vez um homem que tinha muita inveja do vizinho. Um dia ele teve a sorte de encontrar uma lâmpada mágica, e o gênio lhe disse que poderia pedir o que quisesse, mas avisou que a condição para que fosse atendido era que o vizinho ganhasse em dobro qualquer que fosse o seu pedido. Ele não precisou pensar muito para decidir-se:
-- Quero ficar cego de um olho.
Dia desses li a máxima que diz que não é difícil a gente se solidarizar com a tragédia alheia... difícil é ficarmos felizes com as vitórias alheias! É... tai uma alegria para poucos: de quanta força interior precisamos para isso?
Veja como foi ridicularizado o tal copeiro do Cervantes, apostador de longa data da Quina, e que deixou de ganhar mais de 600 mil justamente na semana em que preferiu economizar dez reais... e viu todos os colegas tornarem-se ricos da noite para o dia. Virou esparro dos sentimentos coletivos!
Lúcio Flávio Osório é o nome do rapaz, que teve grandeza de alma suficiente para não deixar-se abalar pela revolta, ainda que tivesse que amargar o arrependimento misturado à ridicularização a que foi exposto pela massa que, assim como ele, não ganhou nada na Quina. A diferença é que, tomado de inveja dos vencedores, o povão fez do copeiro um bom Judas pra malhar, ou uma boa Geni pra jogar pedras.
Lamentei por Lucio Flávio, mas o admirei pela humildade e aceitação. “Não era pra ser”, disse, mastigando a amargura num esforço extra pra agüentar sua condição de bode expiatório.
Enquanto isso, seu destino serviu de mote ao escárnio geral, de refrão ao regozijo da inveja, esta energia que também faz girar o mundo e descer cada vez mais baixo o ser-humano.
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