sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

O Tempo do Alfredo

                                                                                                      
"Ainda sou do tempo em que viajar para outro país era coisa sem volta, coisa de migração em que a pessoa sozinha era aventureira e, se a viagem fosse com a família, seria mais do que aventureira; seria de risco total conforme fizeram alemães, italianos e japoneses em determinada época para o Brasil. Eles vieram para substituir a mão-de- obra escrava, que havia sido abolida. As condições daquela gente chegando aqui eram terríveis, sendo alojados  nas mesmas acomodações dos escravos já libertos. Alemães não vieram nessas condições, mas vieram fugindo de um sistema político ‘nazismo’ que se impunha gradativamente na Alemanha, até que por fim – duas guerras mundiais.
 
Com essa visão de grandes viagens é que passei a minha infância e juventude e até hoje não consigo entender como uma pessoa sai do seu país, desembarca em um aeroporto do outro lado do oceano e... some numa multidão de desentendidos.

 O estigma de uma viagem para outra cultura, onde as normalidades são absolutamente contrárias às de um país como o Brasil me fariam sentir um estrangeiro no planeta Terra e, não mais um estrangeiro na terra em que nasci, sem falar em outro país, com outra língua e outra educação. Em comum com estes, eu teria a aversão pelo sistema periódico do povo brasileiro e, explico: brasileiro vive de pedaços; cuida mal de tudo e ninguém pensa em preservar nada. Nossa política é exatamente o resultado catastrófico da nossa maneira de viver e não podemos mesmo reclamar disso porque em cada um de nós mora um sentimento de aproveitador de rebarbas. Somos assim, brasileiros para brasileiros, e por isso mesmo tão desprezado em qualquer outro país civilizado do mundo.

Não sou adepto de viver fora do lugar onde nasci e, por mais que admire o sistema organizado de cada país do primeiro mundo, sou daqui, desta terra-de-ninguém.

Pra mim, a senhora Jacy tem razão. Não devemos nos mudar do primeiro ambiente, e pronto. Hoje, acredito que minha família nunca deveria ter saído de Baixo Guandu, onde de certa forma construiu um patamar, apesar de todos os problemas que vieram em seguida. Devíamos ter ficado por lá e criado uma força familiar forte, estabelecido uma fonte de renda e, mantido a vida e os bens até então adquiridos. Teve uma época em que eu quis até comprar, da minha  família, a casa do meu avô, mas desisti e tudo ficou por isso mesmo.

 Ao contrário do que possa parecer, fico sendo mais uma vez seu admirador pelo fato de sua coragem de ter se estabelecido nos Estados Unidos enfrentando tudo o que enfrentou e superou. Que foi audacioso, foi. Eu não tenho este espírito, aliás, sou mesmo é muito medroso para encarar grandes mudanças e, por outro lado (veja como são as coisas) – não fui medroso para me embriagar por anos e anos, sabendo do risco, confiando apenas no ‘taco’, como se diz numa gíria. É admirável a tal confiança, mais admirável do que a coragem de uma pessoa que se mudou de Brasil para os States com a ‘cara e a coragem’, porém – se é que me entende – de resultados absolutamente inversos.
 

 Hoje a minha vida, por muita sorte, ainda pode ser considerada até boa, tendo em vista tudo o que desprezei, e não reclamo desta sorte, mas sei que encurtei “My Way”  -   http://www.youtube.com/watch?v=-vNFbSVlS2I


 Apesar das minhas colocações e confissões, repito que não devemos chorar nesta vida. Ao contrário, devemos é rir, e aqui em casa procuramos sempre, sempre, ver tudo pelo lado do humor; quando não dá, até olhamos pelo humor negro. Sempre humor – bom humor – porque a vida, se você reparar...  a (vida) do vizinho, ela é gozada e dá mais pra rir do que pra chorar. Portanto, colocando-se na pele do vizinho, e de lá olhando a sua própria vida, você vai ver que dá, também, mais pra rir do que pra... chorar.
É issssssssssssso!!!!! "


                                                                               (Por Alfredo Petersen)
                                                                       
                                                                          Texto retirado do blog Barão de Sacocheiro



5 comentários:

  1. Fiquei honrado! Sou obrigado a mostrar isto para todos os meus amigos. Fiquei honrado e feliz demais Fernanda. Não me adianta nada tentar ser comedido e bancar o durão. Sou seu fã eterno desde os tempos do JB e pronto. Foi um presente majestoso estar publicado em nada menos do que no seu Blog e isto, da importância do seu Blog, o tempo, que avança, dirá no momento absolutamente certo. A mala da sua postagem era o que realmente faltava. Obrigado!

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  2. Alfredo querido, eu também sou sua fã e adoro as coisas que você escreve no Barão de Sacocheiro. Fico feliz com a sua alegria.! Mil beijos!

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  3. O Alfredo mandou muito bem: "...porque a vida, se você reparar... a (vida) do vizinho, ela é gozada e dá mais pra rir do que pra chorar. Portanto, colocando-se na pele do vizinho, e de lá olhando a sua própria vida, você vai ver que dá, também, mais pra rir do que pra... chorar.É issssssssssssso!!! ". Nós somos o outro, do outro lado, né?

    Eu já tinha afirmado, anteriormente, em comentário do seu post
    de 12/02/14, algo similar: " ...na verdade todos(as) acham todos(as), indistinta e eventualmente, estranhos(as), sem exceções). O "serumano" além de esquisito, tem esquisitices mil rs. No entanto, convém sempre ter uma postura cautelosa antes de sair criticando o que não conhecemos ou não sentimos".

    O sentimento de "ser estrangeiro", de não encontrar sua tribo....está presente neste excerto do belíssimo poema Lisboa revisitada, do Nandinho Pessoa:
    "Outra vez te revejo - Lisboa e Tejo e tudo -,
    Transeunte inútil de ti e de mim,
    Estrangeiro aqui como em toda a parte,
    Casual na vida como na alma".
    Santé e axé!

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  4. Sou neto de italianos. Meu avo paterno chegou ao porto de Santos num vapor quando tinha apenas 1 ano de idade. Veio no colo dos pais, bisavos que nunca conheci, que foram para o interior do estado de Sao Paulo trabalhar em fazenda de cafe. Meus avos, pais da minha mae, tambem chegaram no Brasil pelo mesmo proposito.
    Vieram para uma vida dura mas, se decidiram assim, ou foram enganados ou a situacao na Italia estava muito ruim. De qualquer forma, a vinda dos italianos foi motivada por outros fatores do que a vinda dos alemaes.
    Meu espirito aventureiro levou-me para a Varig em 1972. Quem diria... Vi um anuncio no jornal, fui la, passei por uma quantidade enorme de testes/exames, passei, virei comissario de bordo.
    No inicio, era Rio - Sao Paulo mas, depois de alguns meses, passei a fazer voos longos (nao tanto pelas distancias mas sim pelas rotas malucas e tempo de voo) e comecei conhecendo o interior do Brasil. Mais tarde foram as capitais, depois os paises vizinhos, depois a America Central, a Africa e, finalmente, a America do Norte e a Europa.
    No inicio de 1993 fui chamado para fazer um curso preparatorio para ficar baseado em Honk Kong. Durante esse periodo, recebi um telegrama em casa, solicitando o meu comparecimento na chefia. Fui e fui demitido (junto com outros 600 comissarios)... Era o inicio do fim da Varig e eu me senti mais perdido do que cachorro que cai de caminhao de mudanca, numa situacao tipo "Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come".
    Bom, perdi o meu emprego, entrei com uma acao trabalhista (descumprimento do contrato coletivo), recebi um monte de dinheiro, comprei um sitio em Pachecos (entre Itaborai e Marica), sai do apartamento maravilhoso na Domingos Ferreira esquina Santa Clara que estavamos negociando para comprar...
    Acredite ou nao, passamos o melhor ano das nossas vidas naquele fim de mundo (levando em consideracao o lugar de onde saimos) mas, como a unica coisa eterna que conheco eh a palavra eternidade, chegou um tempo em que aquele monte de dinheiro virou um punhadinho, a acao que movia nao se movia e emprego que era bom nao conseguia, soh me restou uma saida: o aeroporto!
    Ainda foi possivel, antes de embarcar com a familia e algumas poucas coisas de muito valor sentimental nas malas, vir, entrar em contato com conhecidos, alugar um apERtamento, comprar algumas coisas .basicas. Dai, embarcamos (eu, esposa, filho de 10 anos), chegamos em New York num mes de fevereiro logo apos uma nevasca que havia coberto os carros, fomos para a nova casa e fomos a luta.
    Minha esposa, que no Brasil havia saido do emprego quando engravidou, voltou a trabalhar duro assim como eu. Comecei numa firma que entregava comida congelada e dai fui para restaurantes pois estava proximo ao meu trabalho perdido. Fui a luta, deu certo, fui promovido, consegui aplicar para o Green Card e em 2010 recebemos a cidadania americana (nesse meio tempo aconteceram duas coisas: VENDI o sitio!! E ganhei a reintegracao na acao que movia e, claro, mandei a pioneira enfiar a minha reintegracao no trazeiro do Rubel Thomas...)
    Tudo o que contei aqui foi para "responder" a uma parte do que o Alfredo escreveu: "...e até hoje não consigo entender como uma pessoa sai do seu país, desembarca em um aeroporto do outro lado do oceano e... some numa multidão de desentendidos."
    A resposta esta em algumas palavras: Medo, coragem, falta de opcao, determinacao, sonhos e pesadelos, familia, sobrevivencia.

    Grande texto, Alfredo!

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    1. O bom das coisas é quando a gente consegue compilar todo um passado em algumas linhas e o tal passado, estar premiado com um final perto do feliz, bem mais perto do que poderia ter sido. Alcançar é isto! É derrubar obstáculos, o que é mais do que saltar obstáculos, porque assim o caminho fica livre para que outros possam ver como é que foi feito. Na minha cabeça passou um filma sobre a sua vida. Um filme premiado.

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