quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Um pratinho de experiência de vida

À beira de completar os 87 anos, minha amiga bate o martelo:

-- Cortei o doce!

Antes que o leitor imagine que ela cortou, mesmo, do verbo “cortar”, uma bela fatia de doce de leite ou de bananada (duas de suas especialidades culinárias, aliás), eu digo que não: ela cortou do verbo “abolir”, “parar de”, “extinguir” e eticétera.

Levo um susto com uma decisão assim tão... “decidida”:

-- Por quê?

E ela responde cheia de razão,  já que afinal falava o óbvio:

-- Faz mal!

Mas péraí... resolveu assim, de repente, aos quase 87, parar de comer doce? Não parece um despropósito? Lembrei de uma senhora conhecida, fumante de quase toda uma vida e que foi obrigada a abandonar o cigarro aos 90 porque estava com câncer no seio. A coitadinha parou e padeceu seus últimos dias sem a fumaça costumeira para aliviar o estresse. Adiantou alguma coisa?

Minha amiga hoje está conversadeira e me tira do devaneio ao dizer, meio revoltada:

-- As pessoas me encontram e dizem “nossa, você está tão bem...”. Estou “bem” é uma ova! Posso até estar arrumadinha, mas eu é que sei da dor que bate aqui e que bate ali... ai, credo!

Tento ser solidária.
-- Velhice é muito ruim, né?
Ela escorrega no mineirez e exclama:
-- Ô! Sem dinheiro, então, é um desastre! E o povo pensa que velho já morreu e se esqueceu de deitar. Dia desses a empregada me perguntou por que é que eu não dou as minhas roupas. Perguntei por que é que ela não dá as dela... e tem mais: ninguém conversa com velho, ninguém pede opinião ou entende que a gente  é adulto. Mas se você quer saber é até melhor, sabe, porque  conversar dá um trabalho danado! Demora, custa, a voz não sai direito... discordar, então... ai que preguiiiiiiça... dá um trabaaaaaaalho... então eu concordo com tudo. Por isso mesmo vou te dizer que mudei de ideia porque você tem razão: desisti de cortar o doce. Passa a faca aí que eu vou cortar de verdade um pedaço desse queijo pra acompanhar.

Experiência de vida? Eita coisa boa, sô...

5 comentários:

  1. Uma das melhores coisas de envelhecer é que a gente chega a um monte de conclusões sobre a vida e deixa de fazer as coisas que não valem a pena ou de que não gostamos. Envelhecer bem é caminhar para a vida que queremos levar.

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  2. A minha avó materna,vai completar 90 anos em outubro próximo,e a lucidez dela me dá inveja.Ela fala da sua chegada aqui no Brasil,(na época da última guerra mundial)sem esquecer um só detalhe!
    O engraçado,é quando ela quer se empanturrar de doces,massas e frituras,e eu não deixo,aí ela fala que depois que envelheceu,perdeu o seu domínio,os netos são quem mandam nela.

    Monica.

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  3. Como fui alfabetizado (razoavelmente) em priscas eras, ainda quando se escrevia phoda-se (com ph mesmo rsrs), e sabedor, no bom e velho mineirês...de que Deus, quando tira os dentes, enlarguece a goela, vou abrir os trabalhos, queriDannemann, citando algumas frases cujo autor é uma das minhas muitas paixões:

    “Ninguém é tão velho que não espere que depois de um dia não venha outro.

    Nada é menos digno de honra do que um homem idoso que não tenha outra evidência de ter vivido muito exceto a sua idade.

    Não é uma questão de morrer cedo ou tarde, mas de morrer bem ou mal.
    Morrer bem significa escapar vivo do risco de morrer doente.”
    Sêneca .

    Homens são como vinhos...alguns, com o passar do tempo, melhoram suas qualidades (mais no sentido intelectivo- espiritual, enfim, de riqueza ou beleza interior) mas, infelizmente, a grande maioria avinagra. Sabe-se , inclusive, que quanto mais jovem o enólogo, mais complexo e sisudo é o vinho. Já quando a bebida é elaborada por enólogos mais velhos (sábios), tornam-se mais prazerosas, alegres e fáceis de degustar. Por isto que, em muitos casos, quanto mais velho, melhor...até os antiquários comprovam esta tese.Pretendo, humildemente, ficar antigo... jamais velho.

    Importante perceber que, se cada vez mais cedo o ser humano começar a preparar-se para o processo de envelhecimento, procurando viver de forma saudável, longe de uso e abuso de drogas, desenvolvendo atividades físicas regulares, alimentando-se adequadamente, ingerindo grande quantidade de água, realizando suas atividades laborais satisfatoriamente, conquistando o apreço e a amizade dos outros, usufruindo o lazer e do entretenimento e tendo sempre em vista a criação de projetos futuros que sejam voltados à coletividade, com certeza, sua vida terá um sentido concreto e sua velhice, será então, a continuidade da sua vida.

    Em relação ao envelhecimento, Aristóteles achava que uma boa velhice era aquela em que o ser humano não apresentasse enfermidades. Quem quer evitar o processo natural de envelhecimento, que busque morrer o mais cedo possível, então.

    As queixas não devem ser atribuídas à velhice e sim ao caráter do ser humano, pois aquele que é naturalmente tranqüilo e bem humorado, não sentirá o peso dos anos e aquele que não apresenta estas características, não só a velhice, mas a própria juventude lhe é um fardo bastante pesado, portanto um processo de envelhecimento tranqüilo e saudável, depende de uma juventude e/ou maturidade tranqüila e saudável.
    Santé e axé!
    Marcos Lúcio

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  4. Reparando aqui e ali, vejo que sentir-se com mais de 80 anos, 100 talvez, depende, para os que estão chegando la, de uma entrega. Para os que não se entregam e, que estejam em condições de não fazê-lo, a vida 'continua', tal como o senhor da reportagem que aos 100 ainda pretende trocar de carro e tem toda razão. Um carro para ele não deve ser um carro com risco de enguiçar, atrapalhar seu tempo, interromper sua viagem rumo ao exclusivo. Creio que sua amiga tem toda razão ao separar-se definitivamente do doce e acabei de comprar a ideia e não vou mais comer doce também. Envelhecer é mesmo caminhar para a vida que queremos levar.

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  5. Fernanda,

    Se os exames medicos estao bons, "cortar" um prazer, de jeito nenhum. Eu sou da opiniao que voce pode comer de tudo, mas com "moderacao".

    Devemos sim, "cortar" as coisas que nos fazem mal.

    Procuro tratar do corpo e da mente, pois descobri que sou eu, o meu melhor amigo e o pior tambem ....

    Beijos

    Gilda

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