sábado, 21 de setembro de 2013

Cambista acidental


Confesso: foi de olho na comissão que andei dois quilômetros no calorão carioca (apesar do sapato desconfortável) e fui parar num terminal de ônibus onde se concentravam os metaleiros a caminho do Rock in Rio.

Depois de arriscar a vida atravessando a avenida tomada pelo trânsito caótico, tive o prazer de me sentir um verdadeiro marciano ali no meio daquele povo vestido de preto, quase todos de coturno apesar do calor, meias-finas rasgadas e piercings pra todo lado. Mas o estranhamento foi de mão-dupla, porque é claro que a turma não estava entendendo muito bem o que é que aqueles dois “tiozinhos” esquisitos estavam fazendo ali: meu amigo e eu, os dois de roupinha clean e cara de fãs do “The Carpenters”. Logo alguém nos apontou e mandou a piada:
-- Onde aqueles dois deixaram o disco voador? KKKKKKKKK!

A situação esdrúxula tem explicação: meu amigo ganhou dois ingressos num sorteio e queria faturar um tutu com eles. Para me convencer a ir junto, me veio com esta, o malandro:

-- Se eu conseguir 400 nos dois te dou cinquentinha... já pesquisei tudo na internet: eles estão vendendo a 350! Vai ser moleeeeeeeza e daqui a gente vai pro shopping torrar a grana.

Fechamos a cem o valor da minha comissão e lá estávamos, os dois metidos a espertos, tentando parecer cambistas profissionais. Ele, animado, tomou a frente:

-- Você tem que se mexer, minha filha... quer ver, vou te “amostrar”...

E começou a oferecer o produto:

-- Vai um ingresso aêêê, “mermão”? Tenho dois... duzentinho cada, na moral...

A turma nos olhava com desconfiança. Ser cambista não é pra qualquer um, e acho que não transmitimos credibilidade. Várias tentativas depois, ele teve outra ideia:

-- Melhor ir na fonte e vender para os cambistas.

-- ‘bora lá!

Polícia pra todo lado, identificamos loguinho os cambistas da área. Meu amigo caiu de chofre:

-- Ó o ingresso!!!! Doizinho na mão!!!

O outro fez cara de interesse:

-- Pra que dia?

-- HOJE! Sò metaaaaaaal...

O homem fez cara de nojo e superioridade.

-- Não compro merda. Roqueiro não tem grana, é tudo fodido. Só tem fodido aqui...

No instante seguinte vendeu dois por 80 reais. Olhou pra gente, de relance, e fez um muxoxo:

-- Tô dizendo? Oitenta!

Seguimos adiante e então eu é que fiquei com nojo. Os banheiros químicos ostentavam portas abertas e rapazes fazendo xixi. Um cheeeeeeeeiro... cruzes! O que é que este povo bebe? Todos têm suas latinhas de energético na mão, mas acho que é fachada pra disfarçar o formol. Ardeu meu nariz! A única porta fechada durou pouco: vi o sósia do João Gordo sair lá de dentro e gritar para os amigos:

-- Não falei que dava pra cagar?

Foi neste ponto que caiu a ficha: o que é que eu estava fazendo ali? Melhor afanar um tutuzinho na carteira do meu marido do que tentar bancar a cambista em show de metaleiro.

-- Vende os dois por cem e v’ambora!

Meu amigo pesou prós e contras:

-- Mas aí tua comissão já era!

Enquanto ele se digladiava com o cambista, na negociação das duas capas de chuva ordinárias que vieram com os ingressos, eu olhava aquele povo paramentado e estranhava a cara tão séria de quem estava indo para um show de música... será que era apatia? Nas filas enormes para entrar nos ônibus, os metaleiros pareciam saber muito bem para onde estavam indo: a festa na qual as pessoas chegam a ficar dez horas no meio da multidão suada, segurando o xixi na bexiga... onde a  música é tão alta que ninguém dorme nos bairros vizinhos, onde celulares são roubados às centenas, comida vencida é vendida nas lanchonetes e tubulações de esgoto arrebentam...

Pensei em tudo isso e só consegui dizer uma coisa:

-- ET phone home!
 
 

2 comentários:

  1. Hola Sólo quería decirte que algunas de las imágenes no
    se cargan correctamente . He probado en tres navegadores diferentes y todos dan los mismos resultados
    .

    My page; acne rosacea

    ResponderExcluir
  2. Mauro Pires de Amorim.
    KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK. Já tô até imaginando a cena, pois gosto de heavy metal, hard rock e punk hardcore, além de outros estilos musicais também. Sou bem eclético, musicalmente falando;
    Mas quando era jovem, já que estou ficando um velhote de 48/49 anos, costumava frequentar esse ambiente.
    Hoje em dia, nem tanto, afinal mesmo o Lemmy Kilmister, fundador e membro até hoje do Motörhead, com seus 67/68 anos, quando chegou na faixa dos 45/50 anos, deu uma sossegada e virou um sujeito mais caseiro, menos farrista e focado na carreira, preferindo deixar a festança para as suculentas em degustações íntimas recíprocas.KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK.
    Mas lendo seu texto, morro de rir, porque o heavy metal e os punks são espontâneos e a espontaneidade deve ser encarada como traço de sinceridade e portanto, o bom rock é sincero e deve ter sido essa boa e gostosa vibração honesta da sinceridade e da espontaneidade que me faz gostar e nutrir carinho por esses estilos musicais, pois meus melhores momentos da juventude, que foram melhores por serem sinceros, honestos e espontâneos, inclusive junto a uma pessoa, especial, muito querida por mim naquela época, teve como fundo musical, a trilha sonora do heavy metal, do punk e do hard rock.
    Felicidades e boas energias.

    ResponderExcluir

Dicas para facilitar:
- Escreva seu nome e seu comentário;
- Selecione seu perfil:----> "anônimo";
- Clique em "Postar comentário";
Obrigada!!!!!