terça-feira, 27 de março de 2012

Eu e os velhinhos que de fofos não tinham nada

As comemorações sobre o centenário de um ator famoso me fizeram lembrar do exato instante em que aprendi a não tietar ninguém. Eu era ainda uma menina ingênua e recém-chegada das Minas Gerais, aquela terra tão diferente do Rio de janeiro e que, àquela época, antes do vídeo cassete, da TV a cabo, do celular e da Internet, era tãããããão distaaaaante do povo da Rede Globo...

Ou seja... estava eu no esplendor da minha alma caipira na tarde em que andava por Copacabana e opa... aquele ali não é o velhinho simpático da televisão???

Não tive dúvidas: tratei logo de “cercar o frango”, como se diz no interior.

-- Ô, seu Fulano, tudo bem com o senhor? É um prazer enorme estar aqui à sua frente...

Ao que ele me interrompeu, curto e grosso:

-- Ah, não me enche o saco, ô garota! Vai amolar outro e me deixa em paz!

Choque total.

Precisei de alguns segundos para me recompor, mas não perdi a fleuma e consegui sair com o nariz (como sempre) em pé, não sem antes dizer umas verdades...

-- Cruzes! Mas que velho mal-educado! E na novela ele parece tão bonzinho...

Este passa-fora foi o bastante para me mostrar que paparicar os “famosos” não está com nada, e foi também minha primeira aula sobre como nem todos os velhinhos do mundo são uns fofos. Anos depois, num ônibus na Barata Ribeiro, aconteceu a segunda aula. Eu estava já de pé no corredor, prestes a descer no próximo ponto, quando o velhote magriiiiiinho que se equilibrava à minha frente implorava ao motorista indiferente:

-- Meu filho, por favor, me diz qual é o último ponto da Barata?

Depois de vê-lo repetir a pergunta em tom suplicante algumas vezes, enquanto o negão que ia ao volante não lhe dava a mínima, eu, Super Fernanda, protetora dos velhinhos indefesos, entrei em ação e pronunciei as palavrinhas doces e mágicas:

-- O último ponto é o próximo...

Ao que o velhote virou-se e mandou, mais ríspido impossível:

-- E eu lá te perguntei alguma coisa, ô sua enxerida?

Desta vez, mal tive tempo para me recuperar do choque e dizer que ele era um grosseirão, porque meu ponto tinha chegado e precisei quase que passar por cima dele para poder descer.

A terceira aula aconteceu no dia em que me apressei para abrir a porta do elevador e deixar que duas senhorinhas entrassem antes, com suas muitas sacolas de supermercado. Mas quando botei a mão na porta, para abri-la, uma das duas resmungou, de forma que eu pudesse ouvir:

-- Grossa! Garanto que a mãe não deu educação...

Não pude crer.

-- A senhora está falando comigo?

-- É, com você, mesmo, que é uma sem-educação! Tá com pressa pra entrar no elevador? Pode entrar que as velhinhas esperam...

Tentei explicar que não, eu não estava com pressa e só queria mesmo era ser gentil, mas acho que elas eram surdas ou malucas, porque não ouviam nem entendiam... como minha paciência sempre teve limites, e eu também não era flor que se cheirasse (agora estou melhorzinha...), entrei no elevador , deixei que a porta se fechasse e gritei lá de dentro:

-- É, quando acordei, de manhã, decidi que hoje eu ia sacanear umas velhas...

Mas a pior, mesmo, foi a quarta e definitiva aula, que rolou num ônibus para São Paulo, em plena Rodovia Dutra, quando educadamente falei com a senhora que ia no banco de trás:

-- A senhora dá licença para eu puxar um pouco a cortina? O sol está me incomodando...

-- Não dou licença coisa nenhuma, sua cadelinha!

“Cadelinha”?! Assim, sem mais nem menos? Do nada?! Mas não é só comigo mesmo que acontece uma coisa dessas?!

A discussão pegou fogo no 1001, enquanto as duas freiras que dormiam pesado nos bancos da fileira ao lado roncavam e soltavam uma sinfonia de puns, e o cara da outra poltrona devorava um saco de cheesitos com a boca aberta e cara de quem está adorando a baixaria... no meio da briga, repentinamente caí em mim e pensei o que é que eu, a Princesa Real, estava fazendo ali, naquela situação grotesca... e botei um ponto final na crise.

-- Tá bom, ô maracujá de gaveta, pode ficar com a cortina toda pra você, porque sua pele está mesmo pedindo socorro, e eu sou jovem e linda e ainda posso me dar ao luxo de tostar ao sol.

Liguei meu CD player (alguém se lembra do CD player?) e cantei junto com o Raul, enquanto pensava em tudo aquilo e me convencia, mais uma vez, que o ser humano (inclusive eu) às vezes é mesmo um bosta!


11 comentários:

  1. Antonio Carlos
    estou ficando velho. pago o preço de não ter morrido jovem. A despeito desse inelutável fato,evito grupinhos de mnha faixa etária(50). por achá-los um saco, quer os de bom nível intelectual, ou não. As situações de grosserias atitudinais e comportamentais relatadas por você, são corriqueiras no pessoal da melhor idade? As mulheres, sem qualquer sexismo, pontificam em grosserias, atuações histericóides e portadoras de respeito adquirido, simplesmente, por serem velhas. Muitos fingem não entender a lógica das filas de idosos, exigindo prioridade em qualquer fila, e ai de quem faça qualquer observação contrária á esse olhar senil-egocentrico.
    pessoalmente, vigio-me para não transformar-me no velho sabichão-mala, com discursos e textos enfadonhos e repetitivos. No plano afetivo-sexual, até o momento, nunca namarei nenhuma mulher acima dos 35 anos, desejando permanecer nesse patamar. Afinal, de velho, estou satisfeito comigo. Finalizo, citando o célebre aforismo nelsonrodrigueano: canalhas também envelhecem. Estão aí, vivos, sarney, Maluf, Lula e velhos calhordas anõnimas.

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    1. Antonio Carlos, eu também me eforço para não virar uma velhinha desagradável. Acho que o segredo é ser feliz. Abraços!

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  2. Mauro Pires de Amorim.
    Uma das questões é que os mau-caráter também envelhecem e com já possuíam essa personalidade desde mais jovens, a mantém e aproveitam-se de sua condição de idosos como um mero esteriótipo ou disfarce para criarem situações distorcidas, absurdas e conseguirem alguma vantagem injusta e indevida dos incautos que avaliam superfiacialmente todos os idosos como sendo bons velhinhos. No sentido de que, como se a seleção natural para ingresso na 3ª idade, levasse em conta a avaliação positiva do caráter.
    Outra questão é que idoso também tem seus dias de mal humor, por variados e específicos motivos, assim como todos nós. Inclusive, pelas limitações físicas impostas pela velhice diante do cumprimento das tarefas diárias, sem haver um aumento aquisitivo que lhes proporcione maior conforto de amparo assistencial.
    A 3ª hipótese trata do fato de que, muitos idosos, habituados com a falta de paciência e consideração para com eles, desenvolveram um jeito ressabiado de ser. Uma forma de defesa prévia contra tal atitude, acabando arvoradamente e erroneamente, interpretando antecipadamente qualquer gesto que se tenha em relação a eles, ainda que seja em consideração e respeito. Criando desse jeito, neuróticos e até paranóicos da 3ª idade.
    Em minha vida como cidadão e especificamente advogado, já passei por situações semelhantes, especialmente uma bem marcante, referente à primeira hipótese ou questão por mim relatada, na qual, um cidadão por ser mais jovem do que o(a) idoso(a), foi arvoradamente, injustamente e até ilegalmente tratado, inclusive por autoridades, tendo seus direitos básicos de cidadão ditatorialmente caçados, simplismente, com base na avaliação prévia da aparência física por mim descrita na aludida exemplificação da questão ou hipótese.
    Felicidades e boas energias.

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  3. Mauro Pires de Amorim.
    Prezada Fernanda, cometí um erro gráfico em meu comentário anterior. No 1º parágrafo, logo no princípio da 2ª linha, escreví "com", quando na verdade, deveria ter escrito "como".
    Mais uma vez, sinceros desejos de felicidades e boas energias.

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  4. Mauro Pires de Amorim.
    Prezada Fernanda, perdoe-me por incomoda-la mais uma vez com meus erros de grafia comertidos em meu comentário inicial. Imperfeições de quem é redator e revisor (risos).
    Enfim, no 4º parágrafo, na 7ª linha, onde escreví
    "caçados", na verdade, deveria ter escrito "cassados".
    Mais outra vez e sempre, sinceros desejos de felicidades e boas energias.

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    1. Mauro, não fiz a correção porque o Blogger não permite que eu mexa nos comentários. Abraços!

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    2. Mauro Pires de Amorim.
      Tudo bem Fernenda, eu entendo.
      Aliás, mandei as mensagens anteriores mencionando meus erros, não com o intúito de te fazer de revisora. Imagina! Seria pretensão demais da minha parte, algo quase egocêntrico. Você já é redatora e revisora de seus textos, ainda ter que bancar a babá dos textos alheios. Aí é demais!(muitos risos). Enviei-as, apenas para constar e assumir os erros por mim cometidos. Perfeição absoluta é algo do mundo das deidades ou divindades.
      Felicidades e boas energias.

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    3. Mauro... aqui é a "Fernenda"... (kkkkk)... olha, se eu pudesse arrumar tudo, eu arrumava, e isso não seria problema não! Bjs!

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  5. Pois é, queriDannemann…quem não morrer “antes do tempo”, de “susto, bala ou vício”, ou quem não praticar o suicídio e tiver boa saúde ou cuidados, necessariamente irá se tornar idoso, como ordem natural das coisas. Se quisermos ser tratados com respeito, em qualquer idade, temos de respeitar qualquer idade, consequentemente, posto que, o respeito é a maior e melhor forma de civilidade para a salutar convivência com as diferenças, ou seja, com todos, pois não há duas pessoas iguais. De mais a mais, o que fazemos de bom ou ruim, volta para nós, como caixa de ressonância que a vida é. Quase sempre colhemos o que semeamos, ainda que inconscientemente, levando-se em conta que o que fazemos com “boas intenções”, pode ser maléfico para o próximo, afinal, cada cabeça uma sentença e, bom senso, convenhamos, é para poucos…altruísmo, então, para pouquíssimos.Não podemos esquecer, entretanto, que muitas pessoas envelhecem sem amadurecer e tornam-se crianças velhas inoportunas e perigosas , tanto para si mesmas, quanto para seu entorno e “cuidadores”. Por serem inconsequentes, trazem trabalhos desnecessários e exaustivos, lamentavelmente. São impacientes, incautos e irascíveis. Cabelo branco não é, necessariamente, garantia de experiência, muito menos de boa índole, afinal, canalhas também envelhecem. PessoaS são como vinhos, algumas, com o passar do tempo, melhoram suas qualidades, outras, avinagram.

    Envelhecer realmente não significa ficar mais sábio, mais lúcido, mais paciente e nem mesmo melhorar a conduta perante a vida e as pessoas.. Todavia, a crueldade humana faz com que devamos proteger os mais velhos. Não há outra saídA, levando-se em conta que poderemos ser, nós mesmo, um deles, a não ser que a vida interrompa este processo natural em nós e nos leve, ainda ativos, jovens e vem dispostos, para "aquela conversinha básica como CRIADOR".
    Abraço forte
    Marcos Lúcio

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  6. Oi Fernanda,esse lance de paparicar famosos eu não consigo,até porque sou um poço de timidez.
    Quando eu morava no Rio de Janeiro,certa vez cruzei com o Nuno Leal Maia no calçadão de Copacabana,na época ele estava atuando na novela top módel,confesso que sentí vontade de falar pra ele o quanto eu gostava do Gaspar Kundera que ele fazia,mas a minha timidez foi mais forte... Bjs.

    Monica.

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  7. Como me disse, certa vez, um amigo meu: "Com a idade o que você tem de bom melhora e o que tem de pior piora".

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