A verdade a gente sabe: no escurinho da vida íntima,
cada um sabe de si e transa com ou sem amor, e ninguém tem nada a ver com isso.
Mas aí entra em cena, na tela do computador, a Catarina,
moça de vinte anos que afirma não ter problemas financeiros e diz “não
estar nem aí” para a opinião pública... e que conta ter leiloado sua virgindade
porque achou que isso seria uma “aventura”.
Tá bom. Mas diz aí, Catarina: aventura de que tipo?
As aventuras podem ser muitas na vida, para o bem e
para o mal do coração, da lembrança, dos sentidos, da emoção, da autoestima, do
corpo e do espírito. E olha, lamento dizer: isso não tem nada a ver com
caretice. Aos vinte anos a gente ainda não sabe, mas uma das leis da natureza
reza que não dá pra passar imune pelas coisas... tudo, tudinho o que a gente
faz reverbera vida afora, e aí é que são elas...
É triste observar ao ponto de descaso que chegamos com
nossos sentimentos: um leilão de virgindade pela Internet é um sintoma de que
algo anda muito esquisito no reino dos homens... uma sede de novidade, de ser
moderno, de ter bala na agulha, de ser desejável... é tudo isso misturado a uma
incrível capacidade de mastigar, engolir e digerir qualquer coisa: hoje em dia
as pessoas aceitam tudo, se adaptam a tudo, consideram tudo normal mesmo que
seja esquisito ou que cause indigestão.
E quando as relações (sociais, familiares,
profissionais ou sexuais) viram comércio, como é que fica o sentimento?
Não o sentimento de “posse” de alguém que paga, que banca, que patrocina... ou
exatamente o contrário, a ausência de sentimento de alguém que “vende”, que
aceita, que se submete... mas como é que fica o sentimento de quem cai na real de que a vida é mais que troca ou holofote? E tanto empenho em anestesiar os sentimentos... em nome de quê? De entrar para qual clube?
Os sentimentos, aqueles mais finos da alma, como o
amor, estão entrando em extinção neste mundo tão tecnológico e fugaz, onde
ninguém mais sonha com o primeiro beijo, onde as meninas já não esperam e
idealizam a primeira noite de amor com aquele namorado tão especial, por quem o
coração pula dentro do peito... as moças de hoje não sabem o quanto era maravilhoso esperar por tudo isso. E só falta aparecer aqui alguém me chamando de velha coroca porque estou defendendo o direito feminino ao sexo com amor, com magia, com romance, com um tesão verdadeiro que vem da alma, e não só do corpo.
Minha amiga Isa, moradora de Nova Iguaçu, conta que
em sua vizinhança vê meninas de até nove anos, a bordo de shortinhos, vendendo
o corpo em troca de cachorro-quente na birosca da esquina. Dia desses, segundo ela, uma garota
de 11 entrou no posto de saúde, com o namorado de 14, para fazer o pré-natal.
Os tempos estão terríveis para a mulher, que não
sabe a diferença entre ser livre e ser escrava, e que nem percebe o quanto permite que seu corpo seja sua prisão. E em nome desta ignorância,
quantas se vendem na esquina, em boates luxuosas, na Internet ou num casamento, sem jamais conhecer a felicidade amorosa ou sexual?
Queira Deus que um dia a jovem Catarina saiba o
quanto um beijo na boca pode ser soberano sobre qualquer outra coisa... o
quanto fazer amor com um homem escolhido pelo coração pode ser mágico... é uma
pena, mas por enquanto ela parece mesmo não ter a menor ideia sobre isso.
Alguém aí consegue acordar o Cupido?