sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

O mundo, esta senzala azul


Para nós, que vivemos em um país democrático, chega a ser surreal que ainda hoje aconteçam histórias como a do cineasta iraniano Jafar Panahi, condenado a seis anos de prisão, somados a vinte anos proibido de filmar, sob a acusação de criar propaganda contra o regime de seu país.

Enterrado vivo em seu apartamento, Panahi é a prova de que não só as mulheres são vítimas de governos autoritários atualmente, neste mundo que a nós, ocidentais, parece tão distante daqueles dos tempos de Sócrates, morto pela “democracia” grega, cerca de 400 anos antes de Cristo, e de Galileu, condenado pela Inquisição, 400 anos atrás, a desdizer-se e a viver trancafiado em casa até a morte.

Aqui, mais perto de nós, a jornalista cubana Yoani Sánchez, que com seu blog Generación Y tornou-se uma das 100 pessoas mais influentes do planeta, segundo a Times, também sofre as penalidades impostas por seu governo, por ter a audácia de expressar opiniões divergentes à política de seu país.

Panahi e Yoani são símbolos de que o nosso mundo ainda está muito longe de ser civilizado, e me fazem pensar que estamos em uma grande senzala, porque a opressão está por toda parte, como uma pandemia invisível e de difícil cura.

Mesmo nos países democráticos, todo cuidado é pouco... estamos sempre pisando em ovos, já que as diferenças sociais são verdadeiras focinheiras a calar os mais pobres, tanto quanto os cidadãos comuns que não dispõem de uma farda ou de um cargo importante. É a mesma focinheira, aliás, usada pela “segunda classe” da sociedade: crianças, mulheres, negros, nordestinos e velhos, todos já adestrados pelo sistema.

Ontem recebi um vídeo anônimo que parecia ter saído do bunker do Terceiro Reich, no qual um rapaz esbraveja contra o kit gay, dizendo que o Congresso “perdeu o senso da moralidade e faz a cabeça da criançada, colocando o absurdo como normal”. A amiga que me enviou o dito vídeo, boa pessoa e incapaz de desrespeitar as diferenças, incrivelmente se deixou levar pelo discurso do locutor que não tem coragem de se identificar. É aí que mora o perigo, quando gente de bem não distingue o joio do trigo na fala inflamada dos carismáticos. Alguém aí já viu como o Hitler falava bem?

É também aqui na democracia que, não raro, nos vemos aprisionados a “amigos” e “parceiros” que bem poderiam ser generais em campos de batalha, e que, agressivos ou ardilosos, nos envolvem em suas teias de dominação. E o que dizer do cárcere privado das famílias neuróticas, onde pai ou mãe cerceiam as escolhas dos filhos, incutindo neles a culpa pelo desejo de fazerem suas próprias escolhas e viverem sua própria vida? E os filhos chantagistas que "vendem" afeto e atenção aos pais, conseguindo, desta maneira, bancar os ditadores? E os chefes inseguros, que tocam o terror em suas empresas, liderando os funcionários com mão-de-ferro e autonomia zero?

Quantas mulheres já vi, sendo massacradas por amigos, por terem tido a coragem de dizer que não, não desejam a maternidade, acham criança um saco e preferem viver sem filhos? São vistas como gente ruim, sob a lente das vaquinhas de presépio.

“Toda unanimidade é burra”, bem dizia Nelson Rodrigues, mais um gênio apunhalado pela ignorância da opinião pública. A sorte do mundo é que estes homens e mulheres, cuja opinião não se curva ao medo, carregam a humanidade rumo à luz. Não fossem eles, estaríamos até hoje vivendo em bando nas cavernas, comendo carne crua e acreditando que a Terra é, sim, o centro do universo.


Felicidade é viver sem precisar pisar em ovos !

5 comentários:

  1. As democracias ocicentais são para quem tem dinheiro. Esses têm liberdade, mas os pobres vivem sob a ditadura silenciosa do poder econômico.

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  2. Tenho acompanhado, sempre com curiosidade, cumplicidade e entusiasmo, seus ótimos posts, Fernanda Carolina, e, confesso, não sei de qual deles gosto mais _missão impossível para mim. Arrisco, estretanto, a digitar que este, se não é o melhor, é o mais importante, posto que se refere a algo que está entranhado e é o principal ingrediente do amor: A SANTA LIBERDADE. Onde não existe liberdade ("o seu amor, ame-o e deixe-o livre pra amar... ser o que quiser, ir onde quiser"), evidentemente não há amor de verdade. Enquanto o "serumano" não tiver amor próprio e amar o próximo como a si mesmo, e mais, enquanto ele não fizer aos outros o que consigo gostaria fosse feito, desista: o bem o bom não serão os protagonistas absolutos da quimérica história da humanidade. Infelizmente, na cabecinha de muitas pessoas existe, como registro, o amor romântico _ perigoso e às vezes doentio_, posto que pressupõe , equivocadamente, posse , segurança, ciúme e apego. Mas a vida tem como célula mater a imprevisibilidade.

    Sò o saudável e necessário amor ágape, que é o oposto daquele, constrói, dginifica, aprimora e evolui.

    Meus aplausos, de pé, para seu último parágrafo irretocável e sensato até não mais poder. Brilhante mesmo! e para se guardar (como todo o post).

    Sabedor da desatenção ou da ingenuidade útil das pessoas, acrescento à`sua " segunda classe” da sociedade: crianças, mulheres, negros, nordestinos e velhos, todos já adestrados pelo sistema" os mais preconeituados da sociedade: os homossexuais, posto que constituem, sim, os mais desprezados e menos bem-vindos cidadãos da sociedade ainda muito machistas. Não por acaso, a discriminação começa dentro de casa e desconheço pais que aceitem, naturalmente, esta carctérística que a natureza impõe aos filhos, a despeito da vontade ou escolha deles.É um imperativo biológico inegociável, tanto quanto as outras sexualidades, e não só a normativa e desejada por 11 entre cada 10 procriadores: a heteronormatividade. Até hoje acontece, em alguns casos, de homoafetivos, ainda na adolescência, de serem ameaçados e até expulsos de casa, quando da descoberta pelos pais. Esta não é uma senzala azul, é preta ou roxa_sem preconeito algum_ mesmo!

    Sobre o infeliz e mal resolvido rapaz que esbraveja contra o kit gay, a psicanálise conhece bem esta lógica: antipatias violentas traem ou traduzem afinidades secretas. Tanto que ele nem se identifica pois não admite ou permite se identificar com o homoerotismo. Ele é, evidentemente, um gay enrustido, encubado , com sérios conflitos e auto-rejeição (quase sempre por motivos "religiosos"), enfim, um homofóbico violento em potencial. O próximo passo pode ser espancar ou assassinar um homossexual, numa tentativa frustrada e insana de quebrar o espelho que, a contragosto, o reflete.

    Porém o intolerado desejo, ainda que inconsciente, continuará o mesmo e talvez, até potencialize..o eterno retorno do patologicamente reprimido é fato, assim como seus nefastos desdobramentos.

    O perigo dos inocentes úteis, e não só a sua amiga que não sabe separar o joio do trigo, é que eles servem perfeitamente ao neoliberalismo que jogou tudo no mesmo balaio, e uniformizou comportamentos e desejos...para que as pessoas percam a criticidade e se transformem em massa de manobra para consumir de tudo, independentemente das necessidades. Assim, existem somente consumidores e não mais cidadãos com senso crítico e personalidade.

    Onde não houver o normal: diferença e diversidade _ a principal característica da vida_, além da impermanência... certamente, não haverá vida real e natural.

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  3. Anônimo... falou e disse! (E obrigada por gostar dos meus posts!). Volte sempre... e comente quando puder. Abraços!

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  4. QueriDannemann...sem querer, passei por anônimo, mesmo não sendo aquele doente homofóbico que hão se identificou no patológico e patético video rsrs...Se puder, repasse-o para mim, ok? A idade avançadíssima, ou a pressa?! kkkk, deixou-me esquecer de assinar o comentário. "Moi même": ÉstimMarcos, um dos seus fiéis leitors/admiradores. De qualquer forma, prefiro o anonimato ou ser ninguendade do que ser celebridade da hora (cruzes!!!) Aproveito para corrigir as mal digitadas palavras: preconceituados e machista.
    Santé, axé , abração e beijão procê!.

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  5. EstiMarcos... bem que eu achei que o "Anônimo" escrevia igualzinho a você! Mas, como não tinha assinatura, pensei que fosse alguém te imitando! Bjs!

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