Rabino e celebridade, Henry Sobel é ótimo de conversa: sem papas na língua, ele não tem pudores em dizer, em suas entrevistas, que adorou o Festival de Woodstock, que fumou – tragou – e gostou de maconha, e que um rabino pode sim, errar, porque também é gente. Reconhecido no mundo inteiro por sua veia pacifista, Sobel já não figura entre o personagens dos noticiários de TV, desde que, sob efeito de medicamentos, foi acusado de furtar gravatas, em 2007, nos EUA. Mesmo longe da mídia, ele segue
com seu trabalho. “Não estou afastado. Dirijo os serviços religiosos na Hebraica de São Paulo, principalmente as grandes festas, e também
dou palestras e participo de eventos sobre religião e assuntos semelhantes”, conta. A seguir, a conversa que tivemos sobre o perdão, assunto
de um livro que pretende escrever.
O sr. acredita que foi perdoado pela sociedade?
– Não sei. É preciso consultar as pessoas que me magoaram para saber se fui, de fato, perdoado. Mas estou bem com a minha consciência e otimista em relação ao presente e ao futuro. Tenho muito chão pela frente como
rabino e como ser humano. E as pessoas que não têm vontade ou condições para perdoar, não vão interferir no meu otimismo.
O sr. tem mágoas?
– O que eu sinto é decepção. Como qualquer ser humano, confio nos outros, mas, às vezes, a pessoa receptora simplesmente se revela não digna de confiança. Aí vem a palavra traição. Eu me sinto traído por algumas pessoas, mas sou muito mais recompensado por aqueles que corresponderam às minhas expectativas. E, mesmo quando sou traído, procuro superar meus sentimentos e busco dar uma segunda chance. A mágoa afeta mais a vítima do que o agressor.
– O que eu sinto é decepção. Como qualquer ser humano, confio nos outros, mas, às vezes, a pessoa receptora simplesmente se revela não digna de confiança. Aí vem a palavra traição. Eu me sinto traído por algumas pessoas, mas sou muito mais recompensado por aqueles que corresponderam às minhas expectativas. E, mesmo quando sou traído, procuro superar meus sentimentos e busco dar uma segunda chance. A mágoa afeta mais a vítima do que o agressor.
Seu último livro, Um homem, um Rabino, fala de sua vida. Por que o sr. o escreveu?
– Até esse livro, nunca havia sentido vontade de me abrir aos leitores, mas chegou o momento de falar. O livro foi importante porque achei que as pessoas colocaram em dúvida a autenticidade de algumas afirmações minhas. Foi, em parte, uma resposta aos meus críticos, e também aos meus adversários. Mas o saldo maior do livro foi o meu encontro comigo mesmo. Eu precisava do livro para definir quem eu sou e quais são as minhas metas
para o futuro.
E quem é o sr., e quais são as suas metas?
– Sou uma pessoa que pensa e que, às vezes, se fragiliza por sua sensibilidade. A minha meta é ser eu mesmo. Anote isso: talvez um dia eu
mude os outros, mas nem por isso vou deixar os outros
me mudarem.
Por que é difícil perdoar?
– Porque o homem é egoísta e valoriza mais o orgulho dele do que os sentimentos alheios. É difícil perdoar porque o homem não sabe
distinguir entre o ato cometido e a pessoa envolvida.
– Porque o homem é egoísta e valoriza mais o orgulho dele do que os sentimentos alheios. É difícil perdoar porque o homem não sabe
distinguir entre o ato cometido e a pessoa envolvida.
E qual é a diferença?
– O ato cometido pode ser uma fraqueza do momento, uma circunstância. Claro que me refiro aos casos banais, e não a situações como o genocídio da Segunda Guerra. Na banalidade, o ato em si tem pouco a ver com a
integridade da pessoa que cometeu o crime. É preciso discernimento e coragem para perdoar, porque o homem contemporâneo tem dificuldades para superar acidentes de percurso.
O sr. perdoou os nazistas?
– Há um ressurgimento do antissemitismo no mundo, porque as novas gerações não conheceram de perto a tragédia de 60 anos atrás. Perdi meus avós maternos e paternos no Holocausto, mas perdoei. Mas nós não temos
o dever moral de perdoar os nazistas, porque as vítimas não fomos nós: foram nossos avós e bisavós, que não estão mais aqui. Nós lembramos, mas não perdoamos.
Por que o antissemitismo está crescendo?
– A recessão econômica é um dos motivos. Sempre, em tempos de crise, há a necessidade de buscar um bode expiatório, e invariavelmente o bode expiatório clássico da história é o povo judeu. Também o destaque
dos judeus no mundo econômico e na vanguarda da revolução tecnológica... tudo isso provoca o ódio. A diferença gera a suspeita. Mas nós acreditamos na diferença, porque ela é o pilar da democracia. No entanto, psicologicamente, há um distanciamento das minorias,
principalmente quando aquela minoria se destaca. Mas é impossível sobreviver se as raças não perdoarem depois de tanta intolerância e preconceito, se as religiões não perdoarem depois de tanto ódio e perseguição, se as nações não perdoarem depois de tanto derramamento
de sangue. Perdoar não é esquecer: se fosse, não haveria mérito nenhum no perdão.
– A recessão econômica é um dos motivos. Sempre, em tempos de crise, há a necessidade de buscar um bode expiatório, e invariavelmente o bode expiatório clássico da história é o povo judeu. Também o destaque
dos judeus no mundo econômico e na vanguarda da revolução tecnológica... tudo isso provoca o ódio. A diferença gera a suspeita. Mas nós acreditamos na diferença, porque ela é o pilar da democracia. No entanto, psicologicamente, há um distanciamento das minorias,
principalmente quando aquela minoria se destaca. Mas é impossível sobreviver se as raças não perdoarem depois de tanta intolerância e preconceito, se as religiões não perdoarem depois de tanto ódio e perseguição, se as nações não perdoarem depois de tanto derramamento
de sangue. Perdoar não é esquecer: se fosse, não haveria mérito nenhum no perdão.
É mais difícil perdoar os outros ou a si mesmo?
– Minha experiência me leva a crer que é mais difícil perdoar a si mesmo. Quando eu era menino, ser perdoado era uma necessidade diária: sempre que eu cometia um erro, contava com a compreensão e o perdão dos meus pais. Era um peso tirado do meu coração, uma gostosa certeza de ser aceito. Quando cresci, foi a minha vez de perdoar os meus pais pelos seus erros, reais e imaginários. É um estágio natural do processo de amadurecimento compreender os nossos pais e perdoá-los por serem menos perfeitos do que gostaríamos. Lembro da crítica se abrandando, dos ressentimentos
se dissolvendo, do afeto libertando a alma. E também é bom perdoar a si próprio. Quando me tornei rabino, eu era intolerante comigo mesmo, o autojulgamento era severo, a autopunição, imediata; a culpa, duradoura. Então, me conscientizei de que o rabino também é humano, portanto falível. E ele pode errar. É boa essa sensação: a ausência de medo, o enorme alívio.
CPDoc JB - 19/5/2011
Leia também:
O rabino Henry Sobel me ensinou sobre o perdão
Senhores,
ResponderExcluirTive a graça de conhecer pessoalmente o rabino Henry Sobel, quando ele gentilmente examinou alguns de meus livros.
Sou cristão e brasileiro, portanto tolerante, e amigo de todas as raças e credos.
E sei reconhecer pessoas especiais, talhadas para nobres missões e, sofridas provações.
Ele é um judeu sábio vivo. Aproveitem para conhecê-lo. Recentemente conhecí alguém semelhantemente sábio do Islã, em Dubai.
É pela graça de Deus que homens como o rabino Henry Sobel existem pois são raros os homens como ele, como na igreja cristã e na islâmica, que buscam o Equilíbrio, a Harmonia e a Verdade para a Humanidade. Ele é uma benção de Sabedoria para muitos, de outras religiões também, Homens de Boa Vontade que buscam a Paz na Terra. O mais notável é que ele é humano e também comete erros, dos quais se arrepende. É um igual, porém mais sábio, e talvez mais sofrido.
Don Wílson